O professor de expressão musical. O seu papel e a necessidade de um enquadramento.

Portugal não forma professores de expressão musical para lecionar no contexto de jardim-de-infância.

EDUCACAO MUSICAL INFANTIL

Tendo em conta a análise aos planos de estudo dos cursos de educação musical ministrados nas escolas superiores de educação do nosso país ao longo dos últimos anos e mesmo aos atuais, podemos dizer que, Portugal não forma professores de expressão musical para lecionar no ensino pré-escolar.

Nos planos anteriores a Bolonha, para além de toda a ênfase curricular assentar no pressuposto de que os professores que se formavam, iriam lecionar nos 2º e 3º ciclos do ensino básico, a própria prática pedagógica constante dessas formações superiores incidia sobre os 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básico.

Nos planos dos 1os ciclos de estudos posteriores ao tratado de Bolonha, vê-se, em alguns deles, a preocupação de mostrar como saídas profissionais a possibilidade de lecionar nos jardins-de-infância mas, como para entrar na carreira docente é necessário um 2º ciclo de estudos (Mestrado), essa hipótese cai por terra, pois não existe nenhum 2º ciclo de estudos que habilite para a docência de expressão e educação musical no jardim-de-infância em Portugal.
A expressão musical fica assim a cargo dos "curiosos", ou "professores desempregados", ou ainda de "músicos com boa vontade" que vão agilizando como podem e conseguem a implementação desta área em jardim-de-infância. Parte-se do princípio de que a expressão musical no jardim-de-infância e no 1º ciclo pode ser ministrada pelos educadores e professores generalistas.

Na linha do que vimos defendendo em textos anteriores, não podemos colocar-nos ao lado destas correntes de pensamento. Se "a área da expressão e comunicação na educação pré-escolar e na consequente educação da criança tem uma importância fulcral do ponto de vista da sua real inserção na sociedade como um ser autónomo, livre e solidário" (Silva, 2008: 32), e se verificamos que os educadores não têm uma formação sólida a este nível, pois vêm uma clara e propositada diferenciação "entre a organização curricular dos cursos superiores em educação de infância e os cursos de professores do ensino básico, 1º ciclo, no que diz respeito à distribuição da carga horária", sendo "o número de horas de formação nas disciplinas de expressões (...) superior nos cursos de 1º ciclo" (Silva, 2008: 31), consideramos a coadjuvação do professor de expressão musical imperiosa para que todo o processo vivencial desta área ocorra de forma contextualizada e se efetive no seio do ensino pré-escolar. Tal só se poderá realizar se se formarem professores de expressão musical pois o recurso a "biscateiros", como se evidenciará em textos posteriores, não será certamente uma forma séria de olhar para esta área da formação do ser humano.

Em Portugal existe grande procura de formação na área da expressão musical mas esta ainda não é contemplada ao nível do ensino superior.

Tem havido, da nossa parte, nos trajetos profissionais em que nos vemos implicados, preocupações neste sentido. Referimo-nos a ações de formação como é exemplo "Expressão e Educação Musical: Novos Contextos, Novas Perspectivas". Nestas ações, sentimos e vislumbramos uma enorme vontade e procura de saber por parte dos formandos no que concerne à expressão musical para crianças em idade pré-escolar e até idosos.

Assim, podemos dizer que o profissional de expressão musical em Portugal é, normalmente, alguém com formação na área da música que é convidado para exercer esta função num jardim-de-infância, num ATL, ou num lar ou centro de dia para idosos.

Tal como defendemos em Bragança em 2009, podemos aqui sustentar que no atual quadro educacional do nosso país a expressão e educação musical surge em vários contextos. Estes novos contextos e as novas perspetivas remetem-nos para uma reflexão acerca da formação de profissionais que se enquadrem nas novas realidades emergentes.

Longe vão os tempos em que o professor de educação musical se debruçava somente sobre a criação de estratégias e ferramentas pedagógico-didáticas para a música nos 2º e 3º ciclos do ensino básico. O próprio papel do professor de música e os contextos em que este se insere são diferentes.

As saídas profissionais de um jovem professor ou técnico de educação musical quando termina a sua formação superior são hoje diversos. Para constatarmos tal fator basta-nos uma análise aos próprios planos dos cursos de educação musical ou às saídas profissionais divulgadas pelas Escolas Superiores de Educação. Analisámos em 2009 as páginas Web de algumas Escolas Superiores de Educação como as de Lisboa, Porto, Bragança e a do Instituto Piaget e verificámos que os antigos cursos de Professores do Ensino Básico, 2º Ciclo - Variante Educação Musical, anteriores a Bolonha, dotavam os alunos de competências para que estes pudessem lecionar no regime de monodocência no 1º ciclo do Ensino Básico e ainda para o 2º ciclo como professor de educação musical, embora na prática e para completar horário estes também ficassem com o 3º ciclo na disciplina de música.

Por outro lado, os atuais cursos de educação musical centram-se nas unidades curriculares da área científica de música, passando também por dotar os alunos de capacidades para lecionar esta área em vários contextos formais e não formais. Assim, os novos profissionais poderão lecionar música nas creches, no jardim-de-infância, nas atividades de enriquecimento curricular vulgarmente designadas como AEC's e até nos centros de dia e lares da terceira idade.

Tudo isto vem ao encontro de uma ideia de expressão e educação musical para todos –diremos que se trata de uma perspetiva de inclusão e, mesmo, de direitos de igualdade– responsabilizando-nos cada vez mais para uma constante formação ou, como hoje se defende, para a promoção de uma aprendizagem ao longo da vida também nesta área. Mas, como já referimos, se por um lado as Escolas Superiores de Educação mostram no campo das saídas profissionais dos primeiros ciclos de estudo esta mudança de paradigma, tal não acontece nos segundos ciclos profissionalizantes.

Assim sendo, os técnicos e professores de expressão musical devem fazer uma busca permanente de conhecimentos não só relacionados com a sua área – a Música, mas também relativos à área da psicossociologia, nomeadamente no que se refere ao desenvolvimento e aprendizagem. Esta procura pode ajudar de forma proeminente o pedagogo do século XXI a preparar aulas/sessões de expressão e educação musical adequadas e, assim, muito mais consequentes e repletas de prazer e boa disposição, passíveis de alcançar bons resultados, isto é, de potenciarem a aprendizagem e o desenvolvimento harmonioso dos alunos.

Consideramos no entanto que o facto de não haver institucionalmente a criação de uma profissão de professor de expressão musical fragiliza de forma gritante a posição deste no mercado laboral e no seio das próprias instituições perante os seus pares educadores. Pensamos ser fundamental que nos ocupemos com especial preocupação da estruturação do processo ensino-aprendizagem, especificamente do planeamento das atividades que melhor ajudem o profissional a atingir os objetivos que se colocam à partida. A estruturação de novos cursos de mestrado, pós-graduações e a formação contínua urgem rumo a uma melhoria da qualidade da educação e na construção de uma sociedade mais tolerante.

Se, por um lado, nos debatemos por efetivar o direito humano à educação e à participação cultural, temos paralelamente que formar professores capazes de atuar em diferentes "palcos" educativos. Fomentar inovação e criatividade também passa por facultar saberes outrora estanques. Todas estas questões aqui levantadas e que nos remetem para a mudança e para a participação cultural estão também ligadas às formas de entender a variedade humana e que fazem todo o sentido quando se fala de projetos educativos e de comunidades educativas.

A perspetiva de formação ao longo da vida, (life-long learning), está muito presente naquilo que temos vindo a defender e o facto de não existirem cursos verdadeiramente vocacionados para o trabalho musical com crianças em idade pré-escolar reforça a necessidade de mantermos sempre no horizonte, enquanto docentes, esta visão. A formação ao longo da vida torna-se um conceito emergente e não só inerente aos professores.

O mundo da educação está em constante mudança, não podendo o educador viver do adquirido na sua formação inicial. Há pois uma necessidade de refletir sobre as suas práticas e essas reflexões deverão apoiar-se nas constantes inovações trazidas pela construção do conhecimento científico. Assim, as suas pesquisas deverão abarcar, não só assuntos alusivos à sua área específica, mas, também, conteúdos ligados a áreas do conhecimento que, não tendo uma relação direta com o seu campo de ação, tornam-se particularmente importantes para compreender o meio em que labora, as crianças a quem se destinam os seus ensinamentos, o funcionamento das instituições, entre outros. Este pensamento também nos guia no nosso dia-a-dia e nos trouxe até esta reflexão em que agora nos vemos envolvidos.

Efetivamente temo-nos debatido ao longo destes últimos anos pela implementação de uma nova fase que prevê a inclusão dos professores de expressão e educação musical nos projetos educativos e pedagógicos das instituições do ensino pré-escolar.

Pensamos que a criação de 2os ciclos de estudo idealizados única e exclusivamente para a formação de professores de expressão musical no contexto de jardim-de-infância, seria algo que mudaria o atual panorama para melhor.

A criação de novos cursos direcionados para esta área do ensino possibilitaria trabalhar muitos dos aspetos que temos vindo a defender e que se prendem com a inclusão do professor de expressão musical no jardim-de-infância. O professor que vai lecionar para estas instituições deverá conhecer bem o seu funcionamento organizacional e pedagógico. Isso só será possível se, para além de estudar as temáticas inerentes ao público-alvo a que se destina a sua prática, este estagiar e refletir sobre esse mesmo estágio no Relatório Final, como é exigido atualmente em Portugal a qualquer estudante que faça um curso conducente à profissionalização para a docência.

Fontes Bibliográficas

Amaral, S. B. M. (2009). Expressão e Educação Musical: Novos Contextos, Novas Perspectivas. Investigar, Avaliar, Descentralizar. Actas do X Congresso da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Bragança: Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação e Instituto Politécnico de Bragança. (CdRom): 10_Cmcs_AT6_Pluralidade do Conhecimento e Educação, Mesa nº48 – Comunicação nº314.

Silva, L. L. (2008). A Educação Musical em Portugal. Revista Electrónica de LEEME. Lista Electrónica Europea de Música en la Educación nº21, 29 – 72.

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