A explosão de Michel William | O concerto na Fábrica Braço de Prata
Uma voz que, contida no início, explode assim que se começam a ouvir os primeiros acordes. Foi com compassos acentuados e vibrantes que Michel William se apresentou no dia 30 de setembro, na Fábrica Braço de Prata, em Lisboa.
Um concerto intimista, uma viagem pelo reggae, ska, funk, afro e jazz
Um concerto intimista, como gosta de referir, próximo do público, que nos obriga a viajar até um ou mais géneros musicais. Até porque o seu novo projeto se assume como uma fusão do reggae, ska, funk, afro e jazz.
Michel William é moçambicano e chegou a Portugal há pouco mais de 2 anos. Sem uma editora na retaguarda, está prestes a lançar o seu primeiro álbum como artista independente. O XpressingMusic esteve com ele, momentos antes de o ver atuar, naquele que é considerado um dos locais mais emblemáticos da cidade de lisboa. O burburinho de uma típica sexta-feira à noite compunha o ambiente. As salas da fábrica começavam a encher-se de gente e foi numa delas, pequena e de exposições, que conversámos com ele. Michel tem 27 anos e escreve as suas próprias letras há uns bons anos. Passou parte da sua juventude a cantar ou a tocar guitarra e piano. Fê-lo desde sempre:
«eu nasci com a música, a ouvir a minha mãe cantar. Portanto, a música acaba por ser um refúgio e também uma forma de me expressar».
O músico e a procura da paz
O cantor fala mesmo de uma mensagem que assina todo o seu trabalho: a «procura da paz». É uma das expressões que utiliza frequentemente e arrisca dizer que a sua música é uma «tomada de consciência». E foi com este significado que abraçou o concerto, tocado ao vivo, à porta do último fim de semana de setembro. A noite composta, a Sala Nietzche à média luz e as grandes portadas cremes deixavam entrar o fresco da noite. O Michel cantou, com a guitarra ao colo, ao lado de Carlos Santa Clara, o violonista, que deslizava o arco acompanhando-o num ritmo singular. E, numa linguagem quase próxima da poesia, Michel William intercalava os seus temas originais, com alguns versos que proferia nos entretantos. A plateia envolveu-se, numa atmosfera carregada de emoções.
O seu projeto, como gosta de afirmar, acaba por ser o resultado de muitas linguagens musicais:
«as minhas referências não vêm necessariamente de um artista em concreto. Talvez o hip hop tenha contribuído, pois o rap tem uma mensagem muito forte. Eu procuro a paz, o amor e tento trazer as pessoas para uma energia própria».
«A minha música fala de aceitação, sem barreiras»
Com um plano definido, foi em Lisboa que assentou arraiais. I´ve got a plan é até o título de uma das suas canções e dá o mote ao primeiro álbum. Michel pretende soltar as correntes que prendem a sociedade à discriminação.
«Nós, enquanto seres humanos, não podemos estar agarrados ao preconceito, de raça, género, estatuto social ou outro. Eu procuro abrir o coração das pessoas. A minha música fala de aceitação, sem barreiras».
Por isso, canta em português e inglês. «As canções saem normalmente de improviso, posso cantá-las numa ou noutra língua. Nos concertos isto também acontece. É através deles que interajo com o público». As suas atuações são rítmicas e conseguimos perceber a ligação às diferentes linguagens musicais.
«Há ska, funk, afro ou jazz nos meus concertos. Esta fusão de estilos faz com que o concerto tenha momentos mais calmos no início e se desenrole em momentos dançantes que vão aumentando de intensidade. Claro, que se quiseres dançar, tens toda a liberdade de o fazer».
Primeiro álbum do músico financiado através de uma plataforma de crowdfunding
O Michel escolhe um caminho independente e, por isso, pediu ajuda para financiar o seu primeiro álbum, através de uma plataforma de crowdfunding.
«Eu não pretendo ter uma editora, por isso tive a ideia de pedir ajuda aos meus amigos e seguidores. Quero tentar ser um artista livre para me expressar. De fazer o que sinto da forma que acho certa para mim».
E foi precisamente esta liberdade que fortaleceu o concerto do dia 30 de setembro e que deixou a plateia rendida a uma honestidade transbordante a cada palavra, letra e melodia. Michel William está na cena musical portuguesa, com um projeto de originais, prestes a nascer. O título e o single ainda não estão escolhidos. Uma questão de momentos até acontecer, provavelmente num destes nasceres do sol. Basta ouvir a letra de uma outra das suas músicas: Moment.
Selma Pereira Rocha para XpressingMusic
Fotografia: Rita Delille