BitOcas em Entrevista ao XpressingMusic
Músico experimentador, criador de jogos performativos e pesquisador das questões ligadas à improvisação, ao jogo, à interdisciplinaridade e à criatividade… É assim que se define Vitor Óscar Fernandes, ou seja, Bitocas como todos o conhecem.
O XpressingMusic foi ao encontro deste homem que viaja pelas artes fazendo com que pareçam uma só coisa em si mesma. Nesta conversa com o Bitocas iremos tentar saber um pouco mais sobre as suas criações no âmbito do lúdico e da música.
XpressingMusic (XM) – Bitocas, o que fez com que no início da sua vida passasse pela aprendizagem de tão diversificados instrumentos tais como bandolim, violoncelo, percussão, guitarra…? Andava à procura do instrumento certo que se adequasse ao seu perfil? Algum destes instrumentos se tornou para si um instrumento de eleição?
Bitocas (BTC) – Comecei pelo Bandolim, se quisermos falar de instrumentos convencionais, porque na realidade já batucava, enxagualhava e beliscava em muitas coisas, aliás como faz uma criança saudável. Para mim um instrumento musical é um objeto e um objeto é um instrumento musical. Um violoncelo caríssimo parado não faz música nenhuma, é no músico que está a música. Acho que acabei por me especializar em não especialização, sou muito bom nisso (risos). Já toquei saco de plástico com a mesma sensibilidade, energia e transpiração que a tocar um instrumento convencional… ainda por cima, um instrumento convencional é construído para facilitar a vida ao músico e o saco de plástico não. Para fazer som são necessárias 3 coisas matéria, movimento e atrito, para fazer música basta juntar um músico com musicalidade dentro de si. Tocar em tudo exige uma abordagem pluridisciplinar, são muitas as técnicas que um multi-instrumentista usa e eu que já nem isso sou, até uso verbos para explorar as infinitas possibilidades de um determinado objeto: bater, soprar, abanar, arranhar, deslizar, deixar cair, etc . Imaginem agora um instrumentista especialista em guitarra começar a explorar o seu instrumento com estes verbos todos - “onde é que já se viu”? Chegaria às mesmas conclusões que eu. Espero ter respondido à questão (risos).
Instrumento de eleição? Para cada cena um cenário. Disse o meu avô.
XM – Para além de ter realizado formações no âmbito da música, frequentou outras ligadas ao drama/teatro … Podemos dizer que o “Bitocas” resulta desta diversidade formativa e cultural absorvida em diferentes momentos da sua vida?
BTC – Quando era miúdo queria ser inventor, acho que já aí estava um pouco dessa centelha de pluridisciplinaridade, gosto de desafios e de chafurdar no “por relacionar”. A música veio do contexto familiar, o teatro estava mesmo ao lado dentro da “caixa das artes” mas a abranger mais coisas e as outras áreas, todas de interesse, foram surgindo pela curiosidade.
Sou um autodidata, aliás quando saí da escola oficial é que comecei a estudar os cantos ao conhecimento e com muito entusiasmo.
XM – É certo que também é um apaixonado pela improvisação? O improviso está presente no seu dia-a-dia ou pelo menos em algumas situações da sua vida?
BTC – É interessante essa pergunta porque existe uma ideia cultural sobre improvisar que é errada ou, melhor, provoca erros de leitura e de interpretação de muitos fenómenos. Ainda há pouco tive uma discussão com um amigo sobre isso. Diz-se que improvisar é fazer em cima do joelho, o que está associado muitas vezes a “abordagem ligeira” e “sem preciosismo”. Ora no contexto performativo a improvisação está muito longe disso. Um improvisador tem que ser capaz de aceitar o inesperado e reagir, transformar as falhas em criatividade. Aliás um improvisador não lhe chama falhas mas algo como princípio criativo, algo que gera novos contextos e descobertas. Existem pessoas que gostam de fazer tarefas repetitivas e não questionar, não acho mal, também gosto quando quero relaxar a cabeça…, por outro lado existem as que preferem encontrar sensações novas e sentir-se vivos pela provocação e pelos problemas para resolver que a improvisação oferece de bandeja. É portanto bom, uma boa preparação mental, e até física, para improvisar. Mas não obrigatório. Improvisassem mais… e as pessoas teriam melhor vida. Se não é no dia-a-dia pelo menos em contextos criados para isso. Aconselho vivamente.
XM – O Bitocas está na origem da criação de várias associações como por exemplo a “d’Orfeu” e a “Contador de Sonhos”. Gostaríamos que nos falasse um pouco destes projetos e das funções que exerce em cada um deles…
BTC – (Risos) Terei que pegar na resposta à pergunta anterior. Sou um improvisador. Gosto muito dos inícios das coisas, gosto também que elas perdurem mas sinto sempre que sou mais útil a iniciar outros projetos. É a minha natureza.
A d’Orfeu… estive na sua criação com os meus irmãos e uma série de lunáticos como nós com o objetivo de, entre outras coisas, provar que se podia fazer muita coisa para além de tocar um instrumento musical. No tempo que lhe dediquei diariamente fui caseiro, mediador, designer gráfico, professor, produtor, agitador e muitas outras coisas. Progressivamente fui abrandando lentamente a permanência na d’Orfeu para dedicar tempo ao projeto “O Jogo Aberto”. Atualmente a Lud in absorve-me completamente. Volta e meia vejo-me envolvido em novos projetos performativos ou pedagógicos com a d’Orfeu,. O povoarti em 2005, o projeto comunitário Rio Povo em 2007 e 2008 e Povo que Lavas no Rio Águeda, em 2009 e 2010 dois espetáculos que, além de voltarem a juntar os Irmãos Fernandes, juntaram uma comunidade enorme num palco construído em cima das águas do rio Águeda. Emocionante e provocador de muitas novas sinergias. E não hão-de ficar por aqui.
Quanto ao Contador de Sonhos nasceu primeiro como um projeto pedagógico que propus e desenvolvi com vários infantários e creches, com o objetivo de trabalhar com as educadoras e com as crianças. Aí se desenvolvia o respeito pelas ideias e iniciativas das crianças e trabalhava com as educadoras pedagogias alternativas para promover a criatividade, ou melhor, para deixá-la fruir. Estava muito ligado ao imaginário e logo se transformou num espetáculo que juntou cerca de 500 crianças. Na altura foi um boom. O entusiasmo de todos era tal que se criou uma associação com o mesmo nome para permitir a continuidade da partilha na altura já com cerca de 16 instituições. A associação atualmente está inativa, mas o movimento continuou na rede de relações que se mantem ligada a novos projetos. Como por exemplo o Museu do PovoArti, um povo imaginário, em 2005, criado com Lea Lopez e Francisco Lameiro. Conseguimos voltar a dar formação para educadores na área das artes e criatividade educacional. Deu origem depois ao projeto Educação Criativa e ao seu sucedâneo Ginásio Musical.
XM – Em 2008 surge a “Lud in”. O que nos quis trazer com esta nova empresa?
BTC – Eu sei lá, uma montanha de coisas, ainda ando a arrumar as ideias para perceber.
Primeiro de tudo a Lud in representa uma tomada de consciência do potencial criativo e pedagógico que estava a gerar desde que criei o projeto O Jogo Aberto em 2002, sozinho, eu e as minhas ideias. Tinha já orientado muitos contextos de formação regulares e pontuais e estava a descobrir soluções pedagógicas e criativas para os maiores problemas que encontrava na complexa tarefa de ensinar. Estava a descobrir o enorme potencial do Jogo como veículo para a autonomia no processo de aprender. Estava a descobrir formas de distribuir livremente a liderança nos processos coletivos. Enfim, se até ali tinha perguntas passei a ter respostas.
Passei a ver nesse projeto algo de missão que me iria preencher ao longo de vários anos.
Hoje sei que uma vida não chega para por em prática a quantidade de ideias que me ocorre e percebi que tinha que me dedicar a tempo inteiro, mergulhar na pesquisa, leituras, experimentações, conceções, mudanças de paradigma, simplificações e depois ainda replicar, partilhar, publicar enfim tornei-me numa espécie de inventor de uma forma desformada de praticar e aprender a música e tudo aquilo que metermos dentro. É aí que surge a Lud in (entrar no Lúdico) para oficializar e albergar o projeto O Jogo Aberto e abrir a outros novos campos.
XM – Pode agora falar-nos do “Jogo Aberto” e das suas principais fases?
BTC – O Jogo Aberto foi o nome de código que atribui ao conjunto de pesquisas e iniciativas que iniciei em 2001 em torno da utilização do jogo como ferramenta séria para desmontar e tornar a montar a música e as formas de a praticar. No início, como em tudo, ainda não sabemos bem no que é que vai dar mas estava já convicto que tinha iniciado um caminho longo como aqueles que sobem as montanhas e que nunca vão a direito. Já lá estava o potencial mas caí nesse caminho por acaso. Apesar de encontrar nessa época muitas aplicações práticas para o que estava a descobrir, tive também a consciência de que não era necessária pressa, depois de andar tantos anos a experimentar muitos caminhos e a desviar constantemente de direção, tinha agora finalmente uma linha orientadora, algo que servisse de elemento comum entre o cruzamento de disciplinas e saberes.
Consideraria seis fases, desde que comecei a utilizar o jogo na prática musical e pedagógica. A 1ª fase (até 2001) que poderíamos chamar de experimental ou pré-lúdica foi a que considero a fase das experiências ainda sem a ideia de jogo, embora com muita ludicidade mas muito mal estruturada. Foi todo aquele tempo sem início claro que antecedeu O Jogo Aberto propriamente dito. Desde, por um lado, as procuras de informalidade curiosa na música desde o inicio da d’Orfeu e as experiencias no inicio do Tocarufar com o Rui Júnior onde não havia sequer instrumentos e era necessário criar dinâmicas ricas e divertidas para aqueles miúdos e, por outro lado, às primeiras tentativas de transformar o espetáculo, normalmente com narrativa linear, numa narrativa aleatória e imponderável, um pouco como aqueles raros livros em que o leitor pode escolher algo que define para que página tem que saltar na narrativa. Foi uma época muito cansativa porque as ideias estavam a brotar com muita força e tinha que, ao mesmo tempo, fechar projetos e preparar malas porque tinha um convite para preparar um espetáculo para ser apresentado todos os dias durante 4 meses na Expo2000 em Hanover, Alemanha. Cheguei lá estoirado, mal da coluna e gago. Foi estafante mas, 4 meses noutro contexto, recompôs-me fisicamente e quando regressei vinha livre de compromissos mas ainda não lavado da cabeça. Entrei numa espécie de depressão, tinha 32 anos - era altura para isso (risos). Lembro-me de desejar largar a música, queria abrir para outras áreas e fechei-me em casa, conversava com amigos e com livros, li muito e, subitamente, com o livro O Jogo das Contas de Vidro de Herman Hesse fez-se luz, ou melhor meia-luz porque a outra metade foi um workshop promovido no Porto pelo meu amigo Alberto Lopes, também inventor musical, com um guitarrista canadiano chamado René Lussier, onde o jogo era o motor dos exercícios musicais de composição espontânea. Foi com o cruzamento entre estas duas realidades, um livro e um workshop específicos que me fizeram correr para casa ao outro dia com a cabeça a ferver e numa só tarde criei, a partir de apontamentos antigos de aulas, cerca de 20 jogos todos para desenvolver diferentes capacidades num músico estratega. No fundo já tinha o jogo no bolso mas ainda não lhe tinha encontrado a casa da partida.
Enfim, começou aí a 2ª fase, que diria fase lúdica (entre 2001 e 2003) comecei a desenvolver o papel do jogo e dos seus sistemas sólidos de regras como facilitadores da improvisação musical e como geradores de criatividade e autonomia. No fundo tinha encontrado algo sólido para democratizar a prática musical. Num espaço curto de tempo vou desde os primeiros ensaios de oficina sobre a voz e o jogo musical na Casa do Rio, crio o coletivo O mistério das Vozes Vulgares com quem exploramos o melhor dos jogos performativos e sou convidado pelo ACTO, Instituto de Arte Dramática para preparar um workshop musical que facilitasse a seleção de artistas músicos de 3 países: Holanda, Áustria e Portugal. Aí comprovei a eficácia do jogo musical como desbloqueador natural da natureza musical de cada um.
A fase seguinte (2003-2005) foi essencial na exploração do jogo fora dos workshops e contextos de formação. Agora como motor de música em cena, em performance e espetáculos de música improvisada, entre o sério e o burlesco.
Na 4ª fase (2005 a 2007) ou fase comunitária, voltei às origens, aos mais novos e ao imaginário criando o PovoArti e uma antropologia ficcionada num projeto com educadores e infantários onde gostei de redescobrir o trabalho em equipa a Léa Lopez, Francisco Lameiro e o André Silva. Comecei a colaborar com a Oficina de Aveiro, com as Oficinas criativas para os mais novos e criei as oficinas no parque (na Alta Vila) para começar a envolver outros criativos e curiosos em torno do jogo musical e da criatividade na música. Foi a época de tornar O Jogo Aberto um projeto comunitário passando estas novas metodologias para muitas mais pessoas.
A 5ª fase acho que foi a fase do salto quântico. A necessidade de resolver alguns problemas na relação do jogo musical com aqueles que não estão habituados a ele e inibições ou dificuldades especiais de alguns grupos, dediquei-me à pesquisa de soluções e, à medida que surgiam os resultados tanto no meu entusiasmo como de quem experimentava, abriu-se campo para novas e profícuas experiências. Um exemplo foi o de dar objetos aos jogos, até aqui praticamente só com sistemas de regras. Agora com objetos que controlam os parâmetros da música, os jogos estão muito mais democráticos e divertidos. Só visto. Funcionam como jogos performativos de mesa. Outro foi a tomada de consciência de uma classe de músicos chamada “não músicos” cunhada pelo poeta sonoro Américo Rodrigues que me convida para montar pontualmente duas orquestras de não músicos a par com o criativo musical Nuno Rebelo. Outro exemplo ainda foi a transferência destes métodos para outras áreas como o Teatro e o cruzamento multidisciplinar ao criar jogos e contextos lúdicos em outras áreas como ambiente, matemática, desporto, etc.
Foi nesta fase que surgiu o AparqA- Centro Criativo da Alta Vila, em colaboração com o Município de Águeda, para a dinamização do Parque Municipal da Alta Vila onde haviam começado simples oficinas, agora transformadas em múltiplas atividades para todos os públicos.
Logo em seguida criei a Lud in uma empresa para estruturar e organizar todos estes projetos em surgimento. Foi nessa altura que surgiu o Ricardo Falcão e imediatamente criámos uma dupla imparável. Assim, chegámos à fase atual agora com uma equipa de 3 pessoas: Eu, o Ricardo Falcão, que cuida da imagem e comunicação, o Gil Abrantes na produção e uma comunidade em crescimento em torno de várias atividades tanto regulares como pontuais. Esta fase é a mais complicada de definir porque é a atual. Mas chamamos-lhe “fase do código aberto” porque os conteúdos pedagógicos e lúdicos do projeto são de livre utilização, como acontece no software “open souce”, e estão a ser ensaiados em contextos diferentes por participantes em atividades nossas.
XM – A Música e as Pedagogias Alternativas são também abordagens que têm sido levadas a cabo desde 1991. Gostaríamos que partilhasse com os nossos leitores este percurso que vem até aos dias de hoje… Fale-nos também dos concertos didáticos…
BTC – Ora está bom de ver que se não renovamos a nossa maneira de ver as coisas e de as praticar, entramos em modo automático e repetitivo e deixamos de poder saborear o que fazemos nesta vida. É por isso que um músico experiente provoca a si mesmo “falhas” ou saltos no vazio ou, se quiserem, variações na execução para ter com que se entreter e daí gerar novidade e frescura na sua execução. É isso mesmo que temos que dar, ou melhor, disponibilizar nas escolas e todos os contextos de aprendizagem. Há muito para fazer, já foi dito e escrito por muitos, muitas teorias e, apesar de as estudarem, os futuros professores terão dificuldade em as ensinar ou aplicar porque deixam de ser curiosos por sua negligência ou exigência dos modelos de educação. Existe demasiada competição e pouco colaboração.
Os jogos ajudam a perceber estes dois estremos. Outro problema no ensino é a ideia de que o professor tem que existir sempre e mostrar isso continuamente. Eu acho que o professor deveria fazer como o mecânico automóvel ou o médico, trabalhar de forma a deixar de ser necessário, ou seja garantindo que a saúde do carro ou da pessoa exista sem ser necessária a sua intervenção. O problema na nossa sociedade é que se ensina os profissionais a arranjar uma peça e estragam outra para não perder o emprego. Outro problema é termos uma cultura demasiado compartimentada em disciplinas estanques. Poucos são os que se ocupam em falar com o vizinho para articular conhecimentos. O vizinho é uma metáfora que representa o que está mesmo ao lado ou acabou de chegar, o novo, a oportunidade, a ideia que faltava, etc.
Temos tudo para mudar, mas falta uma cultura de mudança. São problemas como estes que me fizeram, por exemplo, adotar o jogo como forma de eu próprio deixar de ser o mestre, o ensaiador, o orientador, para passar a ser o colega, o jogador, o estratega, e exemplificador da máxima oriental: “diz-me e eu esquecerei, ensina-me e talvez lembrar-me-ei, envolve-me e apreenderei”.
Todos os convites de trabalho e convívio que me fazem são para mim uma oportunidade de promover uma sociedade mais criativa, menos obesa mentalmente e mais ágil em reação, sincronismo, liberdade, harmonia, espontaneidade etc. conceitos que se encontram tanto na música como em qualquer outra situação. Dessa forma tenho podido aproveitar oportunidades para desenvolver atividades didáticas para públicos de idades muito diferentes, mas os que me agradam mais são os que envolvem públicos híbridos, ou seja, por exemplo, pais e filhos, famílias, educadores e educandos em simultâneo, Jovens e adultos, profissionais e não profissionais. Nessas circunstâncias e ultrapassadas as dificuldades provocadas pela intolerância e falta de flexibilidade, o poder de aprendermos uns com os outros aumenta exatamente pela consciência das diferenças e da importância que tem vermo-nos todos de forma diferente. Aliás é esse outro problema do ensino, achar que devemos todos ter o mesmo conhecimento ou perspetiva. As artes ensinam o contrário, mas infelizmente muitos artistas estão domesticados por uma sociedade demasiado crítica.
Ups! Ia-me esquecendo dos concertos didáticos. São vários: “Ao toque da concertina” com o meu irmão Artur é uma viagem musical e comentada pelos estilos de música que a concertina toca por esse mundo fora; a Viagem no vento que foi um workhop/jogo para pais e filhos na Casa da Música; o “Concerto para pássaros e outros palradores” de educação ambiental e muitos outros. Depois há que dizer que para mim todos os espetáculos que faço são didáticos, no sentido que lhes coloco sempre essa ideia de promover o imaginário e a ludicidade.
XM – A nossa conversa já vai longa e ainda tínhamos tanto para lhe perguntar pois a sua vida tem sido rica e povoada de bons projetos. No entanto, só nos resta tempo para lhe agradecer a amabilidade em ter aceite o nosso convite e deixar-lhe duas questões finais.
Nestes mundos que o Bitocas funde em si mesmo, quais serão os próximos projetos que tem em mente? O espetáculo nas suas mais variadas formas - música, teatro, cinema, artes plásticas – continuará a estar presente nas suas “intervenções”?
BTC – O que tenho em mente? Para simplificar falo só de 2013. Se bem me lembro, já tenho bem com que me entreter:
Neste Inverno, Impro, uma temporada de artes improvisadas onde se inclui um estágio olímpico para ‘Os Primeiros Jogos Olímpicos Musicais’.
Na Primavera, como criar uma cidade lúdica com ‘Há jogos na Cidade’.
No Verão chegará o ‘Fónix, Os Jogos Olímpicos Musicais’.
Em Julho no castelo de São Jorge em Lisboa, com oficinas.
Em Agosto volto à Alemanha para levar mais criatividade ao String Summer Camp em Oberwisel.
No Outono, uma temporada de práticas e artes colaborativas, com workshops, Encontros, troca de ideias e ferramentas.
Em Outubro O ‘Miixer 3.0’ será instalado no ‘Fastival Big Bang’, Festival didático do CCB/Fábrica das Artes.
Até Maio/Junho estarei com a companhia ‘Circolando’ a montar um espetáculo na rua do Barril, a rua onde nasci. Que sorte a minha.
Ao longo do ano, estarei a programar Laboratórios por Medida, um pouco por todo o país.
Com um grupo ‘já’ em Vila Real, irei acompanhar, criando, a transumância da beira interior, desde a Guarda ao Alentejo.
Estamos a preparar a saída da gaveta de um novo projeto relacionando música e indústria. Chama-se ‘Empresa Sonora’ e vai dar que tocar. … Tem o ‘Jogo da Jam’ que pretende criar uma comunidade de músicos em torno da música experimental; tem Laboratórios semanais em Águeda e pontuais organizados à medida de grupos que se organizam em qualquer ponto do país; tem o Ginásio Musical para desenvolver os super poderes musicais e a Fábrica de jogos para aprender a criar jogos e contextos lúdicos; tem o Miixer 3.0 que é uma metáfora não eletrónica das tecnologias áudio; tem no âmbito do AparqA um projeto de destacar, o Fonix - os jogos olímpicos musicais, para o próximo verão, uma paródia imaginativa dos jogos olímpicos mas com provas unicamente musicais e com relevo também para criadores de jogos performativos.
O espetáculo e as várias formas? Claro que sim. Apesar de atualmente preferir dizer a música nos vários contextos. E, não sou propriamente uma pessoa do espetáculo, apesar de ele estar também nas coisas que faço, sou mais do bastidor, das relações transversais, das experiências da improvisação, dos inícios das coisas e da vagareza (devagar) necessária para chegar a tantos interesses. Acabei por aceitar esse caminho porque de 5 irmãos, cada um tomou uma parte do todo e assim nos completamos melhor. A minha irmã, Irene, única que não tem a música como profissão escolheu as matemáticas em que a música se suporta e ensina também; O Artur, o Zezito companheiro, é o compositor; o Rogério, professor, é maestro; o Luís, o pragmático e sim, do palco; e eu, Bitocas o entretido, que sou o do meio e que, segundo dizem os meus pais, e eu comprovo que me lembro, sempre me entretive muito bem com qualquer coisa que me viesse à mão. Por isso vou continuar a desformatar para livremente, como a água, ganhar qualquer forma possível. Temos todos os nossos limites mas “enquanto houver estrada pra andar agente vai continuar, enquanto houver estrada pra andar”.
Bem hajam também pela iniciativa de promoverem comunidades.
Um abraço a todos
BitOcas
"Mistério na Capela"
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