Rita Redshoes: “Assumo-me como uma feminista”

Rita Redshoes, Her

Ela é mulher, cantora, compositora e feminista assumida. Ela ou Her, em inglês, é também o título do seu mais recente disco. Rita Redshoes começa hoje, 19 de novembro, uma sequência de espetáculos ao vivo para apresentar este trabalho. A acompanhá-la estará um quarteto de cordas, num registo clássico mas munido de uma emoção contagiante. É que este seu quarto álbum foi concebido num sinuoso campo exploratório, salpicado com elevadas doses de intuição. O resultado surge na forma de treze canções, um verdadeiro statement à mulher e à sua condição.

Olá Rita, obrigada por teres aceitado esta entrevista para o XpressingMusic. Já tens uma sólida carreira e este é o teu 4º álbum. Foi um fácil conceber este disco? Como surgiu a ideia inicial? Começou com a escrita?
O processo de fazer música é sempre constante. Mas, quando se pensa em fazer um disco, é muito importante delinear uma meta. Foi o que tive que fazer, caso contrário passava o tempo todo a escrever canções. Na verdade, aquilo em que me baseio e acredito é no lado intuitivo das coisas. É isto que faz sentido. Não me revejo, enquanto música ou compositora, a forçar-me. Não o sei fazer, nem acredito nisso. O que aconteceu foi o seguinte: fui reunindo material, fui escrevendo e compondo ao mesmo tempo. A mim, isto sai-me ao mesmo tempo, música e a letra. A dada altura, o timing foi-me imposto: tenho que ter um disco a sair no fim de 2016. A partir daí, comecei a recolher todo esse material e a fazer escolhas. Contudo, foi um processo muito intuitivo, quer a escrita das canções quer a própria escolha.

Tiveste algum exemplo, assunto, experiência ou viagem para a composição das tuas canções?
Sou sempre influenciada pelo dia-a-dia, pelas pessoas, pelas suas histórias, por livros, discos ou viagens. Mas, só me apercebi que este disco ia ser focado na questão do feminino, mais tarde. Isto não aconteceu de uma forma prévia. Acabou por ser uma coisa que estava cá, inconscientemente, uma vontade talvez. Depois, fiz um balanço das canções que tinha em mãos e apercebi-me que era muito à volta do feminino. Acho que tem a ver com a fase da vida em que estou: como mulher, a idade que tenho, as dúvidas que tenho... Enfim, isto acabou por passar para as letras e para as canções. Esta visão de outras amigas e de mulheres à minha volta, das suas histórias, que me marcaram e que encontraram voz nas minhas canções.

Rita Redshoes, Her

És uma artista que assumes as tuas referências e fazes questão de as mencionar. Consegues destacar algumas, como fazendo parte do imaginário deste álbum?
É curioso, pois no outro dia estava precisamente a arrumar os meus discos. Tenho muitos, maioritariamente de mulheres e todas elas, como a PJ Harvey, Nina Simone ou a Joni Mitchel, sempre me influenciaram e me ensinaram muitas coisas. Estas referências estão todas no álbum e isto está relacionado com as escolhas do produtor musical. O universo clássico do Nick Cave, mas com uma roupagem nova e provocadora, acaba por se sentir no disco. Aliás, fiz uma playlist no spotify para partilhar com o produtor e os músicos. Nesta lista, estavam muitas mulheres, Nina Simone, Françoise Hardy, a Nancy Sinatra mas também homens, Scott Walker, Nick Cave. Acho que todas estas referencias se sentem no meu trabalho.

Como surge a colaboração do produtor australiano Victor Van Vugt neste projeto? Foi ideia tua? Como surge esta parceria?
Olha, o nome do Victor esteve sempre nas minhas listas. Dizia que um dia gostaria de trabalhar com este senhor. E, desta vez, o Vasco Sacramento, meu manager, ousou enviar-lhe um email ao qual ele respondeu positivamente, passado um dia ou dois. Foi uma resposta rápida. Para além do Victor ter trabalhado com artistas que admiro muito, ele tinha/tem esse lado que eu procurava para este disco: essa sonoridade clássica mas com uma abordagem contemporânea, mais atrevida e fresca. Foi uma sorte imensa ele ter respondido e ter trabalhado comigo.

O achas que ganhaste com esta colaboração? Aprendeste muito com o conceituado Victor Van Vugt? Consegues, de alguma forma, definir a presença dele no disco?
Sim consigo, mas é difícil de responder. Ele deu-me calma e autoconfiança. Isto passou para o disco, para a minha maneira de cantar e de tocar os instrumentos. No fundo, ele foi dedicado e soube ler-me muito bem. Acho que isso é importante num produtor. Ele saber o que está à sua frente, saber o que há a retirar naquele momento, para o disco. É quase um trabalho mais emocional do que técnico. (embora ele tenha feito a engenharia de som do disco e tudo isso). Mas, no fundo, soube tirar partido das minhas características, enquanto pessoa e música, e expô-las nas canções. Isto é um produtor a sério.

Rita Redshoes, HerSerá que esta colaboração poderá definir novos caminhos na tua carreira e que poderás começar a explorar enquanto artista e compositora?
Sim, aprendi imensas coisas neste processo: sobre mim própria, sobre gravar em estúdio e partilhar o trabalho com outros músicos. Pela primeira vez, gravei fora de portas e com músicos que não conhecia (só os conhecia dos currículos). Tudo isto é uma aprendizagem. Algumas das coisas que aprendi agora, posso nem ter consciência delas. Pelo menos para já. Talvez só tenha esta consciência mais tarde, provavelmente no meu próximo disco.

Não posso deixar de comentar o título do álbum Her. Assumes-te como uma feminista? Se sim, é para ti uma atitude e uma forma de estar? Será que podemos assumir este álbum como uma tomada de posição?
Sim, penso sim, acho que é uma tomada de posição. Assumo-me como uma feminista. Infelizmente, ainda há muito a ideia que, sendo feministas, estamos contra os homens ou contra o lado masculino. Não, de todo. Acredito que as diferenças que existem entre o homem e mulher, são coisas boas e não negativas ou inferiores ou que não devam ser valorizadas. Todos nós, homens ou mulheres, devemos ser feministas. Como tal, o disco acabou por ter este cunho, este universo. E sim, é uma tomada de posição e assumida. Não vou com ´falinhas mansas´. As letras falam deste tema e eu, enquanto mulher, desde pequena (e porque tive mulheres assim na família) sempre tive esta postura. O que senti foi que, através da música, comecei a sentir que deveria falar mais destes assuntos, trazê-los à luz. Há, ainda, pudor e preconceitos que não fazem sentido. Gostaria que este disco conseguisse colocar as pessoas a pensar, que fosse mais um ´ponto´ na discussão. No mundo artístico, há machismo. Acho que a discussão é atual e importante. Gostava que as pessoas se revissem no disco.

Em relação ao single escolhido para o álbum, Life is Huge, sente-se uma emoção quase desmedida. Porque escolheste esta canção e qual o seu significado? É a canção que melhor define a atual compositora Rita Redshoes?
Eu acho que esta canção é aquela que define e engloba todas as canções do disco. Ela fala da ideia da vida ser surpreendente, não ser uma coisa controlada nem domável, embora façamos constantemente planos. A verdade é que a vida tem uma força que é capaz de, obviamente, se alterar por si mesma, sem que tenhamos mão nisso. Isto foi uma coisa que tenho vindo a aceitar ao longo dos anos. Isto obriga-me a viver mais no presente e a tomar posições como esta em relação ao meu disco. Se eu sinto isto e se alguma coisa não está bem, então tenho que fazer alguma coisa. Neste sentido, esta canção é muito emotiva e fala muito dessa ideia, mais uma vez numa perspetiva feminina. Uma mulher que tem esta ideia da menina pequenina e de alguém dizer: “tem calma, crescer é isto, a vida é isto”. É surpreendente e pode trazer muita coisa. Isto é a vida. Há que aceitar e viver a vida intensamente.

Já pensaste no formato deste álbum ao vivo? Como imaginas o espetáculo de Her?
Sim, já pensei. Já estamos em ensaios para a tournée. Estou muito contente, pois vou ter um quarteto de cordas a tocar ao vivo, pela primeira vez. No fundo, imaginei um palco despido e clássico, que respeita o espaço de cada músico. Não há distrações neste formato. Na verdade, gostava que as pessoas ouvissem as canções e sentissem a emoção dos músicos a tocá-las. No fundo, é isto que o concerto vai ser. Outra perspetiva interessante, são as canções antigas com esta versão. Estou muito feliz com os ensaios.

Selma Pereira Rocha para XpressingMusic

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