Celina da Piedade. O acordeão e a voz numa viagem pelas raízes.

Aos 4 anos recebeu o seu primeiro acordeão e aos 5 começou a ter aulas deste instrumento que a tem acompanhado ao logo da vida. Celina da Piedade vê na «música de matriz rural portuguesa (...) uma grande fonte de inspiração e de trabalho artístico». Ainda não avança com datas mas diz-nos que estará para breve a edição do seu próximo álbum, que se chamará “Sol”. «É um regresso ao formato que mistura temas tradicionais com temas de autor, e algumas versões de compositores consagrados. Estou muito feliz com o resultado, enche-me de contentamento dar seguimento à criação». A nossa entrevistada canta o Alentejo como poucos e considera «uma sorte conhecer e dispor de uma tradição musical tão rica, tão dinâmica, com um património tão vasto».
Celina da Piedade, muito obrigado por responder às nossas perguntas. Recorda-se de quando começou esta viagem pelo mundo musical? A música é uma paixão que vem de longe?
Obrigada, é um grande prazer colaborar com a vossa publicação! Desde que me lembro de existir que vive em mim uma paixão imensa pela música, não me recordo de um tempo diferente. Os meus pais contavam-me que logo aos dois, três anos ficava enamorada das montras das lojas de instrumentos.
O acordeão esteve sempre presente?
Sim, o acordeão foi desde o início o meu instrumento de eleição. Aos quatro anos recebi o meu primeiro acordeão e aos cinco comecei a ter aulas.
Considera que a música tradicional portuguesa é dotada de tal riqueza que a sua recriação é sempre possível? Ainda há muito por explorar neste âmbito?
Há tanto para explorar, tanto para conhecer e para desenvolver. Penso que a música de matriz rural portuguesa pode ser uma grande fonte de inspiração e de trabalho artístico. Para mim é-o de certeza!
O palco é a sua “casa”?
De certa forma considero que sim, pelo menos no sentido em que existem poucos sítios no mundo onde me sinta tão confortável e ao mesmo tempo tão útil! A música é dádiva, é partilha e alimenta a alma - o palco pode ser uma espécie de cozinha onde se serve algo que sacia!
Em 2012 gravou “Em Casa” e em 2014 “O Cante das Ervas”. Pode caracterizar sucintamente estes dois trabalhos discográficos?
São dois registos bastante diferentes, apesar de terem sido os dois produzidos por mim e pelo Alex Gaspar. O primeiro, “Em Casa”, é um disco duplo, com temas tradicionais rearranjados por mim e composições originais, uma celebração de muitos anos a fazer música, sempre bem acompanhada, onde couberam mais de quarenta convidados (Rodrigo Leão, Kepa Junkera, Uxia, entre muitos outros). O “Cante das Ervas” é, por seu lado, um disco temático acerca das ervas aromáticas, com temas do cancioneiro alentejano, um disco que se pode ouvir e também provar, porque vem acompanhado de uma mistura de ervas de produção biológica para infusão e de uma erva de tempero. É uma edição criada em parceria com o “Jardim da Boa Palavra”, uma quinta de produção de ervas aromáticas.
Vai seguir esta periodicidade? 2016 é o ano em vamos ter um novo disco da Celina da Piedade?
Embora não possa ainda avançar com datas, está prevista para breve a edição do meu próximo disco, intitulado “Sol”. É um regresso ao formato que mistura temas tradicionais com temas de autor, e algumas versões de compositores consagrados. Estou muito feliz com o resultado, enche-me de contentamento dar seguimento à criação.
A sua licenciatura em Património Cultural e a pós-graduação em Estudos de Música Popular contribuíram para que adotasse uma postura cada vez mais reflexiva e prospetiva relativamente à preservação do nosso património musical?
Sem dúvida, e agora ainda mais, uma vez que estou terminar o Mestrado em Etnomusicologia e a trabalhar como investigadora na área. A teoria, o estudo, a reflexão são essenciais. Mas a prática e o conhecimento empírico também. Acredito que estes dois polos se devem complementar sempre.
Quais são as suas principais influências musicais? Qual a música que mais ouve?
Eu sou bastante “esquizofónica”!... Gosto muito de música folk, de música de intervenção, de música antiga... Gosto dos cantautores portugueses, dos da velha guarda e dos mais recentes. De fusões de estilos... Estou sempre aberta a ouvir coisas novas!
Como e quando surgiu a oportunidade de trabalhar com o Rodrigo Leão?
Surgiu através de um amigo comum, o grande Paulo Marinho (Sétima Legião, Gaiteiros de Lisboa), em 2000. O Rodrigo Leão tinha acabado de lançar o disco “Alma Mater” e precisava de um acordeonista que o acompanhasse ao vivo. Fiquei muito feliz com o convite, não estava obviamente à espera, mas demo-nos logo muito bem, pessoalmente e musicalmente também. Eu sempre fui grande admiradora do trabalho do Rodrigo.
Mayra Andrade, Uxia, Ludovico Einaudi, Gaiteiros de Lisboa, António Chainho e Samuel Úria são alguns dos nomes com quem já trabalhou. Adapta-se com facilidade a projetos tão distintos?
Penso que sim, trata-se de uma questão de “lidação humana”, acima de tudo! Gosto muito de me adaptar a novos ambientes musicais, aceito desafios com muito entusiasmo.
Enquanto artista e compositora já participou em mais de 50 edições discográficas, para além de bandas sonoras para cinema, teatro e dança. A Celina não para...
- Às vezes páro... e já são alguns anos a fazer música! De resto gosto muito de estar em estúdio, de ver os discos crescer, formarem-se, é um trabalho fascinante. E gosto, claro, muito de “andar na estrada”, de fazer concertos, de andar em digressão. É uma vida intensa e por vezes desgastante, mas vale todo o sacrifício!
Atualmente abraça o projeto “Tais Quais”. Como está a sentir a reação do público a este projeto do qual também fazem parte o João Gil, o Vitorino, o Tim, o Sebastião, Serafim, o Jorge Palma e o Paulo Ribeiro?
Os Tais Quais têm sido muito bem acolhidos pelo público e também pela crítica. É um projeto muito especial para mim, há já dois anos que trabalhamos juntos, e tem sido um prazer imenso criarmos música em equipa e fazê-la acontecer.
Cantar o Alentejo é encarado pela Celina como uma missão?
É encarado por mim como um privilégio! É uma sorte conhecer e dispor de uma tradição musical tão rica, tão dinâmica, com um património tão vasto. A missão passa mais pela transmissão dos saberes e pela divulgação, uma vez que, para além de o cantar, trabalho também como investigadora no Projeto de Salvaguarda do Cante Alentejano, no INET-md (Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa).
Muito obrigado por esta partilha com os nossos leitores. Quais os próximos projetos na calha e quais as próximas datas de espetáculos?
Obrigada eu pelo convite! Para além de continuar com o meu trabalho a solo - com novo disco para muito em breve! - e com o projeto Tais Quais, estou a trabalhar num espetáculo de Dança Contemporânea com a bailarina e coreógrafa Rita Vilhena que irá estrear no início do próximo ano. Continuo também a colaborar com Rodrigo Leão, agora como sua convidada. Se tiverem interesse podem seguir a minha agenda e as minhas novidades no meu site. Um abraço aos leitores do XpressingMusic!
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