Sofia Lourenço apresenta Portuguese Piano Music: Daddi e Viana da Mota
Num momento em que decorre a apresentação do CD “Portuguese Piano Music: Daddi / Viana da Mota” entrevistámos a pianista Sofia Lourenço. O trabalho que tem desenvolvido em prol da divulgação de compositores portugueses foi um dos temas abordado. O CD que agora é lançado é uma edição Grand Piano, do grupo Naxos. A este respeito a nossa entrevistada referiu que «A constatação da curiosidade de uma editora internacional de nível de impacto do grupo Naxos foi excelente, tanto para a confirmação do grande projeto que é o revisitar e/ou descobrir estes autores e as suas músicas, assim como para a valorização da minha abordagem interpretativa dos mesmos. Estou muito contente com o facto». A Balada op. 16 de Viana da Mota é uma das obras favoritas da pianista alegando que, para isso contribui o seu enquadramento na sua própria aprendizagem e percurso pianístico. «Ouvi conselhos (muitos) da Helena Sá e Costa, e mais tarde, do professor Sequeira Costa, e ambos me diziam que era assim que o mestre Viana da Mota ensinava ou pensava, ou em última instância, demonstrava e tocava».
Sofia Lourenço, muito obrigado pela atenção dedicada aos nossos leitores. O disco “Portuguese Piano Music: Daddi / Viana da Mota” era um sonho antigo agora tornado realidade?
O sonho antigo tem mais a ver com a minha dedicação à arte do piano e à Música. Este CD fez parte do meu projeto de recuperar a imagem da música do Século XIX, o século “rejeitado”, segundo o autor Paulo Ferreira de Castro.
Como caracteriza este trabalho?
Uma gravação de piano solo de 2 autores fundamentais do século XIX e início de século XX em Portugal.
A divulgação da música portuguesa para piano tem sido uma constante na sua carreira. Sente o dever de mostrar ao mundo a música dos nossos compositores?
O facto de incluir muita Música Portuguesa no meu reportório teve a ver com vários fatores. Em primeiro lugar, por formação, uma vez que a professora Helena Sá e Costa com quem estudei desde os 10 anos de idade, defendia muito o estudo do repertório português, fosse Carlos Seixas, fosse Fernando Lopes-Graça, passando pelo Luís Costa, o seu Pai, pianista e compositor. Quando regressei com caráter mais definitivo de Berlim, dos meus estudos pós graduados de Piano, senti que gostaria de fazer uma gravação que incluísse novo repertório, e gravei em 1999 os “Compositores Portugueses Contemporâneos”, com obras de Filipe Pires, Lopes-Graça, entre outros. Esse CD marcou a minha carreira pianística, uma vez que me concedeu a convicção da importância de resgatar uma interpretação a uma partitura que ainda não tinha sido tocada, ou, literalmente, revisitada.
No meu segundo CD “Estudos & Tocatas”, com obras de J. D. Bomtempo e Carlos Seixas, essa noção alicerçou-se, sobretudo na procura de uma sonoridade e universos tímbricos personalizados, em pequenas obras como os Estudos de Bomtempo, por exemplo.
Seguiu-se o “Porto Romântico”, onde mais uma vez, a descoberta de obras de autores desconhecidos foi-se tornando ainda mais desafiante, como é o caso de Arthur Napoleão, Óscar da Silva ou Arthur Ferreira.
Sentido do dever talvez exista; mas o que realmente subsiste é mesmo um enorme gozo em fazer esta Música...Portuguesa.
De todas as obras eternizadas pela Sofia através de registos discográficos, há alguma que recorde com particular atenção e carinho?
A Balada op. 16 de Viana da Mota é uma das minhas favoritas, sem dúvida, até pelo seu enquadramento na minha própria aprendizagem e percurso pianístico. Ouvi conselhos (muitos) da Helena Sá e Costa, e mais tarde, do professor Sequeira Costa, e ambos me diziam que era assim que o mestre Viana da Mota ensinava ou pensava, ou em última instância, demonstrava e tocava. Esta relação mestre-discípulo, neste caso minha com os meus professores, e deles com o seu mestre - agora já em 3ª geração - acontecia a cada passo. E essa constatação deixava-me sempre num estado de encantamento com a textura musical, e com o conteúdo emocional que coloco em cada uma das minhas interpretações.
O facto de “Portuguese Piano Music: Daddi / Viana da Mota” ser editado pela etiqueta Grand Piano, do grupo Naxos, é por si só um reconhecimento do enorme valor da Sofia Lourenço enquanto pianista e do grande valor da obra que agora se apresenta. Concorda que este disco assume, em simultâneo, essa relevância na sua carreira e na difusão deste repertório?
Sim, concordo. A constatação da curiosidade de uma editora internacional de nível de impacto do grupo Naxos foi excelente, tanto para a confirmação do grande projeto que é o revisitar e/ou descobrir estes autores e as suas músicas, assim como para a valorização da minha abordagem interpretativa dos mesmos. Estou muito contente com o facto.
Ao dar a conhecer a obra de João Guilherme Daddi, quais são as principais características deste compositor que pretende enaltecer perante o público?
É um autor que nasceu no Porto, e que teve um trabalho de extrema relevância na 1ª metade do século XIX em Portugal. A sua música é melódica, lírica, intensa, com algum virtuosismo e imaginação, podendo rivalizar com obras de autoria do próprio Franz Liszt, com quem J. G. Daddi toca em Lisboa, em 1845. Vale a pena ouvi-lo, e quando o toquei uma ou duas vezes ao vivo, o público gostou sempre muito.
Quanto tempo demorou a preparar este trabalho que agora nos é apresentado? Que momentos destacaria do desenrolar do processo?
O processo de gravação e edição decorreu à volta de um ano de duração, mas digamos que o projeto foi amadurecendo há uns dois anos.
Viana da Mota é um compositor que já gravou, que aqui revisita. O que a fascina mais na obra de José Viana da Mota?
Sendo eu própria aluna de dois dos seus importantes discípulos, os quais (em diferentes níveis e ocasiões) tive o privilégio de contar como meus mestres, Helena Sá e Costa e Sequeira Costa, eu conhecia já as obras de Viana da Mota, durante os meus estudos de piano na adolescência. Sempre me impressionou a sua subtileza, virtuosismo e poesia, na nostálgica atmosfera do folclorismo da Música Portuguesa. É um compositor apaixonante, qua alia o emprego de melodias nostálgicas ao vitalismo do folclore, à identidade e à nacionalidade Portuguesas. Juntar à Balada op. 16, as Cenas Portuguesas op. 9 e as op. 18, e a Serenata op. 8, foi uma escolha simples, atendendo à sua variedade tímbrica, à escrita bem adaptada à linguagem pianística, à criação de ambientes interessantes e criativos, para mim, em termos interpretativos, verdadeiros desafios.
Rui Vieira Nery também marca presença neste trabalho, ajudando a contextualizar as obras com os compositores e o tempo em que viveram. Considera que esta ligação entre a obra e o que a rodeia ajuda o ouvinte a fazer uma audição mais cuidada?
Um magnífico texto que incluiu o booklet do CD é da autoria do musicólogo Rui Vieira Nery, o qual estabelece precisamente essa ligação entre o tempo histórico e cultural dos autores e a sua música, propriamente dita. Por esta excelente ligação e pelo privilégio de poder contar com a sua generosidade em prol da cultura Portuguesa, estou-lhe mesmo muito grata.
As apresentações na FNAC Chiado, em Lisboa e na Casa da Música, no Porto, acontecem em dois espaços de referência, com públicos diferentes. Acredita que este disco poderá chegar a um público abrangente? Quais as perspectivas em relação ao impacto destas apresentações?
As apresentações têm precisamente esse objetivo, o de dar a conhecer este trabalho a um público diferenciado. Penso que a presença nas redes sociais e a partilha de informação na rede é também essencial, se não até igualmente importante, para chegar a diferentes públicos. A editora do grupo NAXOS é muito eficaz neste objetivo, e neste momento, o CD já está disponível nos EUA.
Mais uma vez agradecemos a amabilidade. Tem outros projetos que gostasse de abraçar e apresentar em breve?
Estamos agora a apresentar este novo CD, com algumas datas em agenda com concertos e apresentações ao vivo para maior disseminação.
Está ainda a ser terminada uma reedição de um dos meus CD’s anteriores, que será tornada pública em breve.
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