Duarte. A entrevista ao fadista de Évora.

Duarte, fadistaDuarte construiu uma relação ímpar com o fado. Nesta entrevista falou-se da sua carreira e do seu último trabalho “Sem Dor nem Piedade”. Sobre este disco disse-nos: «A minha preocupação com “Sem Dor nem Piedade” não foi a de transmitir, mas antes a de servir - assim como quem serve um jantar. Servir musicalmente um tema e um conceito. Servir o tema do luto num conceito de quatro atos. Um melodrama fadista com vista a uma reabilitação arquitetónica de um “eu” em ruínas». Não deixou de nos falar da forma como foi acolhido na Casa de Fados Senhor Vinho. «Sinto que o Sr. Vinho será para mim um lugar por excelência de formação artística, relativamente à qualidade das interpretações, à escolha do reportório, das composições, das letras. Uma “escola” onde os artistas/alunos são convidados a trabalhar no sentido de obter uma consolidação dos conhecimentos face às suas potencialidades e limitações para que, com esses mesmos conhecimentos, possam definir, o mais autenticamente quanto possível, o seu caminho».

O Fado foi sempre uma paixão? Com que idade começou a cantar o fado?
Esta paixão surge na relação que fui construindo com os fados. Assim como se de uma amante se tratasse. No meu caso foi algo fugaz, no seu princípio, mas que depois se reacendeu aquando da idade adulta, uma vez que comecei a cantar em criança, embora nessa altura ainda não tivesse consciência da força e do significado desse universo artístico.

Duarte, fadistaAprendeu piano e guitarra clássica. Rentabiliza sempre que pode essas aprendizagens?
Tento rentabilizar, aproveitar e consolidar as diversas aprendizagens que vou fazendo de forma a poder crescer com elas. Assim também acontece com a minha formação musical, embora considere que o meu instrumento é a voz.

Há alguma fase na sua vida em que tenha sentido ter encontrado o seu registo enquanto cantor e compositor?
Não houve nenhum flash consciente ou digamos que um dia de revelação de registo ou vocação. Foi um processo que se foi construindo e procurando, pelo prazer das histórias de vida, da escrita e dos fados tradicionais.

Em 2004 lança o seu primeiro disco “Fados Meus”. Como caracteriza este trabalho? Sente que o mesmo teve o devido reconhecimento por parte do público e da crítica?
“Fados meus” foi sem dúvida um marco de iniciação. Digamos que um bilhete de entrada num caminho que fui escolhendo fazer. Uma partida no universo dos fados tradicionais, tentando respeitar o legado dos antigos e sem quaisquer preocupações primárias de reconhecimento ou tentativa de sucesso.

A casa de fados Senhor Vinho, onde actua com alguma regularidade, constitui-se como uma “escola” para um jovem fadista?
Sinto que o Sr. Vinho será para mim um lugar por excelência de formação artística, relativamente à qualidade das interpretações, à escolha do reportório, das composições, das letras. Uma “escola” onde os artistas/alunos são convidados a trabalhar no sentido de obter uma consolidação dos conhecimentos face às suas potencialidades e limitações para que, com esses mesmos conhecimentos, possam definir, o mais autenticamente quanto possível, o seu caminho.

Em 2006 a Fundação Amália Rodrigues concedeu-lhe o prémio “Fadista Revelação Masculina”. Este reconhecimento é muito importante para si? Sente que este reconhecimento lhe conferiu maior projecção?
Quando soube que iria receber o Prémio, o sentimento foi assim como o de ouvir alguém dizer: “Para princípio de conversa não está mal... Agora vê se trabalhas, porque esta coisa das artes não é fácil!”. Gosto de pensar que este prémio foi assim como que um marco inicial no meu caminho enquanto artista. Mas é claro que fiquei agradado e que de alguma forma foi gratificante para mim, não por objetivamente ter recebido o prémio, mas antes pelo reconhecimento subjectivo de outros relativamente à minha “entrada” num meio que até então me estava longe.

Duarte. A entrevista ao fadista de Évora.

Como surgiu a possibilidade de fazer uma temporada de concertos no Teatro Polis de Atenas? Como caracteriza esta experiência?
O meu trabalho com a compositora Evanthia Reboutsika e a cantora Elly Paspala surgiu por num convite que em muito me honrou, por parte desta tão brilhante compositora que, depois de descobrir o meu trabalho via internet, decidiu convidar-me para, com o seu ensemble e a cantora Elly Paspala, prepararmos uma temporada de 12 espetáculos no Polis Theatre em Atenas durante os meses de novembro e dezembro de 2007. Foram espetáculos onde as músicas e os músicos se cruzaram naturalmente, sem que a raiz musical de cada um fosse posta em causa ou se anulasse. Por entre algumas traduções, adaptações e recriações de músicas gregas, também tive comigo nos meus fados, outros músicos e cantores gregos que se deliciaram com a nossa música portuguesa. Foi sem dúvida uma das experiências mais enriquecedoras que tive até então para a minha música. O viver de Atenas, o descobrir da música grega, o valor que os gregos dão à sua cultura, os amigos com quem ainda hoje vou falando e que ficaram por lá, foram coisas que me marcaram e me fizeram crescer.

Posso ainda confidenciar que senti algumas vezes mais apoio e valor face ao meu trabalho na Grécia do que em Portugal. As pessoas que não conheciam o meu trabalho de lado algum, passados alguns dias de concertos, entrevistas várias, programas de televisão e rádio já comentavam e criticavam a minha música.

Duarte, fadistaQuando ouve o seu disco “Aquelas Coisas da Gente” sente que há nele uma maior maturidade interpretativa relativamente ao primeiro?
Não sou muito de ouvir os meus discos depois de estarem gravados. Aliás, sinto que depois de gravados e editados é mais importante que sejam os outros a ouvir e a sentir o disco do que eu. Mas sim, consigo sentir de alguma forma mais maturidade nesse disco. Nas palavras, nas músicas, na forma de interpretar as histórias que estão ali representadas.

Carlos do Carmo, Camané e Amália são as suas maiores influências?
Não me sabe nada bem ter que pensar num pódio de influências. É mais um pote! E nesse pote, para além desses três nomes que foram referidos, também podemos encontrar Jorge Palma, Fausto, José Mário Branco, Jim Morrison, Pearl Jam, Sérgio Godinho, Vitorino e Janita Salomé, Carlos Paredes, João Ferreira Rosa, Maria da Fé, Alfredo Marceneiro, Carlos Zel... e outros tantos que vão ficar por referir!

O que nos pretende transmitir com o trabalho “Sem dor nem piedade”?
A minha preocupação com “Sem Dor nem Piedade” não foi a de transmitir, mas antes a de servir - assim como quem serve um jantar. Servir musicalmente um tema e um conceito. Servir o tema do luto num conceito de quatro atos. Um melodrama fadista com vista a uma reabilitação arquitetónica de um “eu” em ruínas.

Sabemos que este trabalho tem recolhido as melhores críticas em França. Estava à espera deste tão agradável retorno por parte do público francês?
Em Portugal, a meu ver, as críticas também não foram más! Talvez poucas, mas isso é outra história. Quanto a França, não vou negar que me surpreendeu a forma como o disco foi recebido, bem como a forma como recebem os concertos que fazemos. Mas é bom quando os outros estão disponíveis para “desembrulhar” e “saborear” as coisas que temos para oferecer. Haja prazer!

Muito obrigado por todas estas partilhas. Há novas datas que possa anunciar aos nossos leitores?
A meu ver, muitas datas em França e a meu ver, poucas datas em Portugal. No dia 11 de março estarei em Montceau les Mines (França), a 30 de março em Versaille (França), a 31de março, 1 e 2 de abril Rueil Malmaison (França), a 3 de abril em Clermont L´Hérault (França), a 7 de abril no Museu do Fado (Lisboa), a 6 de maio na ExibMusic 2016 (Évora) e a 10 de maio Cherbourg (França).

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