João Pedro Oliveira. A música eletroacústica e a carreira do compositor.
Muitas têm sido as conquistas do compositor João Pedro Oliveira. O ano que agora começa apresenta-lhe novos desafios e muito trabalho: «2017 será um ano muito intenso. Já tenho convites para participar em festivais no México, Chile, Argentina, Itália, Mónaco, uma estreia de obra para orquestra e eletrónica na Casa da Música, várias encomendas, a edição de um CD monográfico, e espero no meio disso tudo ainda conseguir algum tempo para iniciar a composição de mais um vídeo».
Muito obrigado por ter aceitado o nosso convite para esta entrevista. Quando é que o João Pedro Oliveira sentiu o chamamento da música?
É difícil dizer. Tenho muitos momentos na vida, desde a minha infância, em que a música foi importante. No entanto, a decisão de estudar música foi tomada aos 13 anos de idade. A decisão de me dedicar exclusivamente à música foi tomada aos 20 anos, quando estudava música e arquitetura simultaneamente.
O gosto pelo órgão e pela composição caminharam sempre lado a lado, ou a composição apareceu mais tarde?
A composição veio mais tarde. O meu objetivo inicial quando comecei a estudar música era tornar-me organista. Aos 18 anos comecei a interessar-me pela composição. Durante muitos anos a composição e o órgão caminharam lado a lado na minha vida artística. Em 2002 decidi deixar de tocar e somente compor.
Mas também estudou arquitetura...
Sim, e esse estudo tem sido muito útil no meu percurso como compositor. Há noções de proporção, espaço, movimento, que são comuns à arquitetura e à música.
Como surgiu a oportunidade de rumar até à Universidade de Nova York em Stony Brook?
Quando decidi fazer o mestrado e doutoramento em composição, a comissão Fulbright em Portugal apresentou-me diversas universidades onde seria possível estudar. Dentre todas elas, a universidade de New York em Stony Brook oferecia as melhores condições. Tinha um dos melhores estúdios de música electrónica da costa leste e nomes importantes na área da composição, musicologia e teoria ensinavam aí. Foi uma escolha que hoje em dia considero fundamental no meu percurso.
Houve nomes que o tenham marcado muito nessa experiência académica?
Na área da composição, Bulent Arel, um dos pioneiros da música eletrónica dos anos 60 foi fundamental para a minha formação. Na área da teoria e análise, tive aulas com pessoas como Charles Rosen e Sarah Fuller. Também, muitos dos ensinamentos aprendidos com o Prof. SIbertin-Blanc enquanto estudava órgão, especialmente na área da registação, ainda hoje são úteis no meu pensamento composicional.
Embora o reportório composto pelo João Pedro Oliveira inclua ópera de câmara, um Requiem, diversas obras orquestrais, quartetos de cordas, música de câmara, música para instrumento solo, ultimamente tem-se debruçado de forma mais intensa sobre a música eletroacústica... O que o trouxe até esta via?
Na realidade a música eletroacústica sempre esteve presente no meu trabalho, desde 1986. O que me tem interessado mais nos últimos 15 anos são as obras para instrumentos e eletrónica, onde a interação entre os dois media dão o impulso ao discurso musical. Dentro da minha produção, a acusmática tem alguma representatividade, assim como o instrumental puro. Mas a grande maioria das minhas obras são música mista.
Tem na sua “galeria de conquistas” mais de 30 prémios financeiros... Estes reconhecimentos impulsionaram muito a sua capacidade de trabalho?
Sim, são um estímulo a continuar. Muitas vezes estes prémios acabam por passar despercebidos ou ignorados no contexto nacional. Mas em termos de reconhecimento estrangeiro, eles têm sido um fator fundamental.
Algum destes prémios teve uma importância mais significativa?
Sim, tem vários. Por exemplo o Magisterium de Bourges (fui o último compositor a receber esse prémio, antes da extinção do instituto de música eletroacústica de Bourges), ou o Giga-Hertz Award, do estúdio de Freiburg, são prémios que foram sido atribuídos a compositores com reconhecido prestígio internacional (Jonathan Harvey, Vladimir Kotonsky, Jean-Claude Risset, Trevor Wishart, etc.). Fazer parte desta lista de compositores é um grande motivo de alegria.
O João Pedro Oliveira protagonizou um concerto de videomusic nos Dias da Música Electroacústica na Serra da Estrela. Como caracteriza a obra apresentada?
Efetivamente, eu fiz a curadoria deste concerto, onde tinha também uma obra minha. Tratam-se de obras experimentais em que não existe necessariamente uma narrativa visual, mas onde o som e a imagem são ambos compostos como se fossem uma ideia única. O som ilustra a imagem e a imagem ilustra o som. A sua relação é indissociável. Por vezes estas obras são feitas por 2 artistas (um artista visual e um músico), e outras vezes são feitas pelo mesmo autor, como foi o caso da minha obra Petals, inspirada em imagens de pétalas.
Para além da composição tem abraçado a carreira docente. Sente que a preparação de aulas e as deslocações entre instituições de ensino lhe retiram tempo para a composição?
De forma alguma. Um compositor deve manter-se atualizado relativamente ao que acontece no mundo da criação. Ser professor é uma forma de manter essa atualização. Para além disso, o contato e diálogo com alunos, com novas ideias, com perspetivas diferentes é fundamental para renovar o pensamento criativo.
A teoria analítica da música do século XX foi um tema sobre o qual se debruçou afincadamente ao ponto de escrever um livro sobre o assunto...
Foi a minha contribuição para a literatura sobre música, em língua portuguesa. Trata-se de um livro de análise, sem uma aplicação direta à composição, mas que eu acredito que foi necessário para estabelecer uma nomenclatura e dar a conhecer as possibilidades de um método analítico que é referência internacional.
Sente também como um pouco seus, os prémios que têm sido conquistados pelos seus alunos?
Nunca pensei nesse assunto. O meu papel é o de orientar os alunos para que consigam os melhores resultados possíveis. Quando eles são premiados, fico feliz pelo reconhecimento do seu trabalho, e também porque sinto que ainda estou a “dar bons conselhos”.
Muito obrigado pelo tempo dedicado aos nossos leitores. 2017 será um ano de muito trabalho? Há projetos novos na calha que nos possa revelar?
2017 será um ano muito intenso. Já tenho convites para participar em festivais no México, Chile, Argentina, Itália, Mónaco, uma estreia de obra para orquestra e eletrónica na Casa da Música, várias encomendas, a edição de um CD monográfico, e espero no meio disso tudo ainda conseguir algum tempo para iniciar a composição de mais um vídeo.
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