André Santos, as guitarras, a carreira e o disco Vitamina D
André Santos é um madeirense que aos 19 anos decidiu rumar até Lisboa. «Em Lisboa havia muito mais atividade do que na Madeira e isso despertou o meu espírito competitivo (saudável!) e fez-me trabalhar para melhorar a cada dia». Embora jovem já arrecadou vários prémios. No entanto, não os valoriza atribuindo maior importância aos convites que tem recebido para tocar com músicos que muito admira. «Os prémios valem o que valem, para mim, o que tem mais significado é ser chamado para tocar com músicos que admiro ou as pessoas gostarem genuinamente da minha música e do que eu faço à guitarra».
Como deu início à sua aprendizagem? Quando sentiu o chamamento da música?
Tudo começou com a influência do meu irmão Bruno, dez anos mais velho e também ele guitarrista. Havia guitarras pela casa, via-o a tocar e senti curiosidade. Isto começou aí por volta dos 9 anos e a minha aprendizagem até aos 18 foi meramente intuitiva, com algumas dicas do meu irmão e a ouvir e a aprender dos discos. Aos 18 foi quando finalmente decidi que música era o meu caminho.
O jazz foi a primeira opção?
Nem por isso, desde muito novo que ouço bossa nova e um pouco mais tarde comecei a ouvir jazz, também por influência do meu irmão. Sempre gostei de muita coisa e nunca neguei isso, mas houve de facto uma fase em que estive mais obcecado pelo jazz, de forma a aprender o vocabulário e a linguagem. É um estilo que me fascina nas suas mais variadas formas e gerações e com o qual me identifico, embora mais numas vertentes do que noutras. O jazz é muito vasto.
Quando decidiu vir para Lisboa? Foi um passo decisivo na sua vida?
Foi aos 19 anos e foi crucial! Em Lisboa havia muito mais atividade do que na Madeira e isso despertou o meu espírito competitivo (saudável!) e fez-me trabalhar para melhorar a cada dia.
Tem tocado ao lado de vários nomes. Quais as experiências que mais o marcaram até ao momento?
Assim de repente foram importantes todos os primeiros projetos com os colegas da minha geração, aquela fase da procura e experimentação. Aí foram muito importantes, o Miguel Moreira, António Quintino, Margarida Campelo, Mariana Norton, André Carvalho, Zé Maria, Francisco Brito, Vasco Furtado, Federico Pascucci e muitos mais.
Depois houve Malta de geração mais velha que me começou a chamar e a fazer-me acreditar que tinha alguma coisa a dizer musicalmente: Lars Arens, Marco Franco, Demian Cabaud, Jorge Reis, Goncalo Marques, André Matos, Jeff Davis e outros.
Também houve projetos em que substituí o André Fernandes que foram importantes, nomeadamente na orquestra de jazz de Matosinhos e Akiko Pavolka.
Uma experiência fora do jazz que também me marcou foram os dois anos em que fiz parte da banda de Teresa Salgueiro que gravou e fez tournée com o disco 'Mistério'.
Quais as formações que já integrou?
L.A. New Mainstream, Orquestra de Jazz do Hot Clube de Portugal, Orquestra de Jazz de Matosinhos, Teresa Salgueiro (O Mistério), Demian Cabaud (Benespera), Jeffrey Davis/Marc Miralta Quartet, António Quintino (Prólogo) e Gonçalo Marques (Cabeça de nuvem só tem coração).
Embora seja um músico muito jovem, já arrecadou alguns prémios. Quais aqueles que maior significado tiveram na sua carreira?
Os prémios valem o que valem, para mim, o que tem mais significado é ser chamado para tocar com músicos que admiro ou as pessoas gostarem genuinamente da minha música e do que eu faço à guitarra.
No dia 25 de agosto chega o disco Vitamina D. Pode falar-nos um pouco deste trabalho?
Este disco Vitamina D foi maioritariamente composto no meu primeiro inverno em Amesterdão, daí o nome. Foi um choque grande ficar tanto tempo sem ver o céu aberto e a luz do sol. É um disco forte, com a minha personalidade ainda mais vincada, em que abraço a minha bipolaridade musical e toco sem preconceitos. Gosto de muita música e isso vai surgindo naturalmente nas minhas composições e não há como negar, é aceitar e tentar que tudo faça sentido. Eu acho que, mesmo havendo momentos frenéticos, calmos, bonitos e feios, tudo faz sentido!
O disco será apresentado entre os dias 6 e 11 de setembro. Por onde passará esta pequena digressão por terras lusas?
Começa dia 6 de setembro em Leiria e vai por Coimbra, Porto, Castelo Branco, Lisboa e Funchal, respetivamente. Espero que encham as salas! Para além de música boa, vão ainda poder provar algumas iguarias da Madeira. Só por isso, o saldo já começa positivo!
Quem são os músicos que subirão ao palco com o André?
Serão o Tristan Renfrow, um super baterista que conheci no meu primeiro mês em Amesterdão e pelo qual senti uma química brutal, e o Matt Adomeit, um virtuoso do contrabaixo que é uma âncora e um equilíbrio importante para a loucura toda do Tristan. São, mais do que tudo, músicos que tocam sem preconceitos nem julgamentos. Todas as propostas são válidas e o objetivo é encontrar um bom equilíbrio entre espicaçarmo-nos e ajudarmo-nos em palco.
2016 foi o ano em que concluiu o seu mestrado em Jazz Studies no Conservatorium van Amsterdam. Podemos dizer que está a ser o ano com que sempre sonhou?
Está a ser um ótimo ano, com muitas experiências novas, metas alcançadas, novos amigos, novos países visitados, disco novo, mas acima de tudo muita aprendizagem, tanto nas coisas boas como nas más. Não sei se é o meu ano de sonho, acho que esse ainda está para vir, mas é um facto que cumpri muitos objetivos ao longo deste ano.
Muito obrigado por este tempo que dedicou aos nossos leitores. Pode resumir um pouco a abordagem que fez em “CHORDOPHONIA: A new repertoire for Braguinha, Rajão e Viola d'Arame"?
Eu é que vos agradeço e a todos aqueles que dispensaram algum tempo a ler as minhas respostas.
Chordophonia foi a minha tese de mestrado, sobre os 3 cordofones tradicionais madeirenses. Já há muito tempo que pairava na minha cabeça a ideia de explorar a minha cultura, mais especificamente a destas 3 guitarras madeirenses, e assim foi. Resumidamente, estudei a história e as origens destes instrumentos - descobri por exemplo que os madeirenses foram trabalhar para as canas de açúcar no Hawaii e levaram, no fim do século XIX, a braguinha, e possivelmente o rajão, que mais tarde deram origem ao ukulele! São basicamente, os pais do famoso ukulele e achei isso incrível. Depois, a parte mais prática foi a de compor 2 peças a solo para cada um dos instrumentos. Em breve vou voltar a trabalhar mais afincadamente nisso e compor mais e eventualmente gravar.
Fotos: Clara Pereira
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