A Marafona: «os bairros de Lisboa têm tanto de todo o país».
Podem considerar-se uma lufada de ar fresco na música portuguesa, embora seja nas raízes que vão buscar muita da inspiração para os temas que nos propõem. Em entrevista, a Marafona disse-nos: «Temos muita herança nas veias e muitas influências de “monstros” da música portuguesa, mas sim, na nossa humilde presunção acreditamos nisso, na diferença com que contribuímos para a música portuguesa. Sempre foi essa a nossa quimera, poder acrescentar algo mais, dar algo mais. As reações com o público têm sido excelentes e já passámos por momentos que nos comoveram até aos píncaros. Vemos os nossos “velhotes” a curtir a nossa música, vemos a malta da nossa geração a vibrar surpreendidos com as nossas canções, vemos músicos amigos a apaixonarem-se pelo que fazemos espicaçando a sua criatividade, sendo a maior surpresa de todas, a que nunca pensámos que se daria, a de ver crianças a cantar as nossas canções. É delicioso ver o futuro a cantar as nossas canções».
Muito obrigado por nos concederem esta entrevista. A Marafona lançou recentemente o álbum “Está Dito” o que podemos esperar deste disco? Quais os principais pontos de referência musical explanados neste trabalho?
Podem esperar um trabalho generoso, cheio de pormenores musicais, textuais, de imagens e personagens, com diversas texturas e ambientes de canção para canção, ou até dentro da canção. É um disco com garra, mas também de momentos delicados, com outra interpretação, ou olhar, sobre a canção portuguesa, sobre chulas, corridinhos, viras, fados e outros géneros musicais portugueses.
Como já foi dito nos media, este disco é difícil de catalogar, mas garantimos que são acima de tudo cancões bem portuguesas, com a sua originalidade, com tons muito citadinos e uma raiz tradicional.
Mantivemos, a preceito, algum ruído, um lado cru e direto, para dar alma, calor e caracter ao disco.
Consideram que o disco “Está Dito” é um trabalho muito diferente daquele que nos trouxeram com o EP “Tia Miséria” em 2014?
O “Está Dito” é a continuidade da “Tia Miséria”. Está, contudo, mais urbano este disco. Tem mais dos bairros de Lisboa, sendo que os bairros de Lisboa têm tanto de todo o país. Para além disso está mais maduro, pois não podemos esquecer que a “Tia Miséria” surgiu em apenas 6 meses após a reunião deste quinteto em torno de algumas canções.
O conjunto de canções deste “Está Dito” fez-nos sentido, ficaram outras canções de fora por esse motivo. É um momento encerrado que marca um novo ponto de partida.
Quais as vossas principais influências musicais?
São as melhores. Como indivíduos ouvimos de tudo, de toda a parte, do eletrónico ao jazz, do folk ao erudito, do rock alternativo ao metal.
Como portugueses ouvimos o Sérgio Godinho, o Fausto, a Brigada Vítor Jara, os Gaiteiros de Lisboa, o Zeca Afonso, o José Mário Branco, os Galandum Galandaina, o Zeca Medeiros, a Velha Gaiteira ou os Roncos do Diabo, o Mário Laginha ou o Pedro Jóia, mas ouvimos muito os cantares do povo, nas recolhas ou nas festas populares onde ainda habitam os velhos hábitos, as boas memórias.
Como músicos temos percursos entre o Jazz, o Rock, a música erudita e a música Folk.
Podem apresentar-nos a equipa que embarca neste projeto?
Então temos o Artur Serra, na voz, adufe e berimbau de boca, na escrita, composição de canções; o Cláudio Cruz no contrabaixo e coros; o Daniel Sousa na viola, coros, escrita e composição de canções; o Ian Carlo Mendoza, nas percussões, coros e arranjos; o Gonçalo Almeida, no cavaquinho, na viola campaniça, na guitarra portuguesa, nas trancanholas e nos coros.
Todos os 5 contribuem para a construção de arranjos. É um grupo completo e multifacetado, são boa gente e adoram o que fazem tanto como gostam de estar sempre a fazer “piadolas”.
A produção de Sérgio Milhano está bem vincada em todas as faixas deste disco?
Sim o Sérgio tem um papel muito forte no disco, apesar de a produção ter sido realizada a meias com o quinteto. Sabíamos o caminho que queríamos, juntámos essa ideia às ideias do Sérgio que conhecia, compreendia e estimava a nossa sonoridade. Assim é sempre mais fácil.
Mas o disco contou ainda com convidados muito especiais... Podem apresentá-los aos nossos leitores?
Especialíssimos. Eles foram, com muito gosto da nossa parte, o enorme multi-instrumentista Luís Peixoto, músico de cá e de além-fronteiras (Galiza e Irlanda), a nossa tão querida Mitó, conhecida como voz da Naifa, mas por último, sem necessidade de grandes apresentações, essa força da natureza que é a Ana Bacalhau. Um luxo.
Quem compõe as canções da Marafona? É um processo conjunto?
A maior parte das canções da Marafona são criadas pelo Artur Serra, mas o Daniel também compõe. Nos próximos trabalhos podemos ter ainda canções do Ian Carlo, ou música do Cláudio e do Gonçalo. No Está Dito, para além do Artur e do Daniel temos uma canção e letra do Pedro Martins, uma música de Joé Oliveira com letra do Artur, fragmentos de melodias populares e quadras populares.
São criadas num gesto solitário, individual, mas os arranjos são feitos sempre pelo quinteto.
Falem-nos um pouco da origem deste projeto. Como foi que tudo começou? Há quanto tempo se conheceram e embarcaram neste projeto?
O projeto começou há alguns anos atrás, diremos que há cerca de quatro anos como desafio lançado pelo Artur. A ideia, essa era mais antiga, surgia como desejo e não como algo definido, diz o Artur. Mas o quinteto tem apenas dois anos e os músicos encaixaram-se na perfeição, tanto musicalmente como na amizade que foi crescendo num grande abraço. Como resultado a Marafona gravou um EP, o “Tia Miséria”, isto logo após os primeiros 4 meses de trabalho, lançou-se à estrada 6 meses depois do início da banda, que é contabilizada com a entrada do Ian, o último, a 11 de janeiro de 2014. Em dezembro de 2015 começou a organizar-se para gravar o álbum “Está Dito” e ele aí está. Nenhum dos músicos se conhecia antes deste projeto, à exceção do Cláudio e do Daniel.
Têm tocado muito ao vivo? Qual a vossa principal marca em palco?
Em 2015 só não tocámos no mês de dezembro e por opção da banda que se lançava na produção do álbum. As coisas têm corrido bem para uma banda que desponta no panorama musical português que se vê a braços com a crise, mas foi um ano de descoberta do público e da própria banda.
O que mais traduz o que acontece ao vivo é a energia que a banda tem, como é incrível um elenco acústico debitar tanto som ainda nos surpreende, mas também tem momento delicados, ou outros de boa disposição e algum humor. O concerto muda de espaços livres para os espaços fechados e nestes últimos o que acontece é uma interação com o público bastante intensa, pois o Artur gosta de provocar e chamar a um frente-a-frente quem assiste. A viagem é para ser feita por todos! Isto nasceu da necessidade de dar tempo ao Gonçalo para mudar de instrumento e a verdade é que já faz parte do espetáculo, reinando a boa disposição e o conceito de que os músicos estão “sentados ao lado do público”.
Onde poderão os nossos leitores ouvir-vos em breve?
Temos algumas datas muito interessantes que não podemos revelar por respeito às organizações promotoras, mas temos a nossa data de estreia, uma festa promovida pela MARAFONA, no dia 23 de abril, no Teatro Ibérico, em Lisboa, pelas 21:30, com convidados que vão transformar o concerto em outra coisa. Não revelamos as surpresas porque elas são melhores quando se mantêm assim.
A única coisa que queremos para essa noite é a casa cheia porque vamos por certo divertir-nos muito. Será noite de festa!
Consideram que vieram trazer algo de novo à música portuguesa? Como têm sido as reações do público às vossas propostas?
Temos muita herança nas veias e muitas influências de “monstros” da música portuguesa, mas sim, na nossa humilde presunção acreditamos nisso, na diferença com que contribuímos para a música portuguesa. Sempre foi essa a nossa quimera, poder acrescentar algo mais, dar algo mais.
As reações com o público têm sido excelentes e já passámos por momentos que nos comoveram até aos píncaros. Vemos os nossos “velhotes” a curtir a nossa música, vemos a malta da nossa geração a vibrar surpreendidos com as nossas canções, vemos músicos amigos a apaixonarem-se pelo que fazemos espicaçando a sua criatividade, sendo a maior surpresa de todas, a que nunca pensámos que se daria, a de ver crianças a cantar as nossas canções. É delicioso ver o futuro a cantar as nossas canções. Recentemente até recebemos um vídeo de uns pais babados. Derreteu-nos por completo.
Muito obrigado pelo tempo que nos dedicaram. Já há outros projetos na calha que possam revelar aos nossos leitores?
Temos muitas ideias, muitos trilhos, vamos ver quais seguirão em frente, quais respeitam os nossos momentos. Já começámos a trabalhar no próximo disco.
Um exemplo de que falamos é uma possível subversão às regras discográficas, pois gostamos de inventar novos caminhos. Gostaríamos de poder lançar um disco todos os anos, um álbum seria seguido de um EP. Ou seja, para o ano gravaríamos um outro EP, mas sem grande divulgação, porque acima de tudo seria um mimo para as pessoas que nos seguem mais de perto, onde podemos sair mais do conceito original, ou até levá-lo ainda mais a sério. Isto é uma ideia, não quer dizer que aconteça... mas a MARAFONA também começou por uma ideia... Obrigado pelas questões e tempo que nos dedicam a nós. Bem-haja e um grande abraço.
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