António Bastos fala-nos dos seus projetos mais recentes numa conversa informal e bem-disposta…

António BastosAntónio Bastos move-se num terreno musical muito exclusivo construído por ele próprio onde funde as várias influências que foi assimilando ao longo da sua carreira académica e performativa. O Jazz, o House, o Funk, a música tradicional portuguesa, o Rock, o Techno e a música Clássica aparecem quando menos se espera nas composições com que brinda o seu público. O seu currículo como produtor é extenso, tendo os seus trabalhos como Johnwaynes e António Bastos sido editados nas mais prestigiadas labels de todo o mundo tais como Get Physical Music, Cecille, CIC e Compost da Alemanha, Let's Play House dos Estados Unidos, Let's Get Lost, Endless Flight e Mule Musiq do Japão, Brique Rouge, Sui Generiz e Faces/MCDE de França, Raw Cutz e Flame de Espanha, Dissident de UK, Back&Forth de Itália, Serenades da Finlândia, Baile Muzik da Croácia e claro Bloop e Groovement de Portugal.

António Bastos, muito obrigado por nos teres recebido aqui em tua casa, em Aveiro, para esta entrevista. Começamos por te perguntar... É verdade que és músico desde que nasceste, como é vinculado por algumas fontes que consultámos?
Sim, é verdade. Deste muito pequeno que batia nas latas do leite que a minha mãe me dava (risos).

E lembras-te da altura em que decidiste que ias encarar a música como profissão?
No início nunca pensei que a minha vida iria passar pela música porque na altura os pais diziam logo "não te metas nisso! Isso não dá nada", "a música tem que ser um hobbie...", "tens que tirar um curso..." Assim, fui fazendo, paralelamente aos meus estudos, o Conservatório em Aveiro. Depois entrei para a Universidade de Aveiro para o curso de Engenharia Mecânica e quando passo para o quarto ano entrei para uma banda que era a "Malta do Cais" e, como eles iam gravar pela Universal, eu pensei: "Eu vou é mesmo ser músico!" (risos). Disse ao meu pai que ia abraçar a música a 100% ao que ele me respondeu "não faças isso...", ou seja, aquelas coisas do costume... Apostei então na música, embora no início contra a vontade do meu pai. Passado uns tempos já era pacífico (risos)... E cá estou com o quarto ano de Engenharia Mecânica... Depois fiz a licenciatura em Música e por aí fora... (risos).

António BastosEmbora a tua formação seja clássica, temos-te visto ultimamente em projetos mais alternativos como Johnwaynes e outros...
Isso acontece porque tento mesclar todo o meu background clássico com as novas tendências e as novas formas de fazer música, adotando a eletrónica, com as novas tecnologias, ou seja, com os iPad's, com os telefones e com os sintetizadores, agora mais modernos... Portanto o meu conceito passa pela fusão das várias vivências ao longo da vida e que dão o som ao qual temos assistido. Eu tento colocar essa música tanto em palcos de espetáculos como em pistas de dança, fazendo para isso as devidas adaptações. Fiz isso, por exemplo com o The Roses Train... O disco que agora estou a lançar, são as remisturas do The Roses Train que é para passar em clubs. Eu não lhes chamo discotecas porque esse nome é habitualmente conotado com a música mais comercial...

És licenciado em música, com vários mestrados em Jazz, Percussão e novas tecnologias musicais. A percussão foi sempre o instrumento central do teu estudo?
Sim, podemos dizer que a percussão esteve sempre na base mas eu sou muito curioso em relação à música, aos sons e à cultura musical também. Falo da world music, da cultura coral, da cultura de orquestra... Fiz cursos de Direção de Orquestra... Atualmente até sou maestro de um orfeão. Aliás, até tenho uma música que é o Entrudo, música popular portanto, e que se popularizou através do Zeca Afonso... Eu fiz um arranjo com o Johnwaynes que é ouvido em todo o mundo e tenho uma adaptação para coro. Posso também adiantar, em primeira mão ao XpressingMusic, que me encontro a realizar uma versão do "The Roses Train" para Banda Filarmónica. Terá todos os instrumentos de Banda Filarmónica mais a parte eletrónica. Assim terá uma bateria eletrónica e vários sintetizadores numa salutar fusão de timbres e ritmos. A tudo isto ainda juntaremos Coro.

Sendo dono do teu próprio estúdio acabas por ser autossuficiente para realizar as tuas produções... Gravas somente os teus trabalhos ou também gravas outros músicos?
No início comecei por gravar também outros músicos mas isso deixou-me sem tempo para as minhas coisas e agora estou muito focado no meu trabalho... Só gravo as minhas coisas e as coisas da minha editora que agora dá os primeiros passos.

António BastosA tua música esteve presente com várias formações em prestigiados palcos do nosso país. Estiveste presente em festivais, centros culturais, Coliseus, Casa da Música, Queima das Fitas e, além-fronteiras, participaste em alguns dos melhores e mais importantes clubs e eventos em Espanha, França, Bélgica, Áustria, Itália, Suíça, Turquia, Alemanha e Estados Unidos. Há algum palco ou espetáculo que te tenha marcado mais ou de forma mais profunda?
Sim... Há sempre aqueles locais que nós nunca esquecemos... Um espetáculo que nunca esquecerei será o que dei em Los Angeles. A sensação que tive foi a de estar dentro de um filme. Foi algo surreal. Eu olhava à minha volta e via pessoas de todas as nacionalidades, de todas as raças, numa perfeita comunhão com a música. Não estavam ali por acaso. Foram para viver aquele momento, aquela "cena". Há outros momentos... por exemplo com o projeto Bach2Cage que era algo fora do comum porque era multidisciplinar, envolvendo as várias artes (música, teatro, design, multimédia, dança, etc.), recordo-me muito bem dos espetáculos do Porto, Lisboa e Coimbra. Depois, com o espetáculo Johnwaynes, corri vários palcos mas fizemos um concerto que também recordo com muito carinho que foi no Auditório de Ílhavo. Este foi um espetáculo muito cénico, muito experimental, com multimédia... Foi um bom espetáculo que jamais irei esquecer.

António BastosEsses espetáculos de que me tens falado vivem muito da vossa "teimosia" ou já vão havendo instituições, entidades e pessoas que apostam neste tipo de produções?
Esquece... Tudo depende da nossa teimosia, do nosso investimento e do nosso poder de investimento. Ou se é conhecido e se é contratado ou, caso contrário, se aparecermos com uma ideia nova, nem somos sequer ouvidos... Eu quero fazer um espetáculo com o meu novo projeto e se o fizer tem que ser multidisciplinar num conceito de expressões artísticas integradas. É assim que estou a pensar o espetáculo "António Bastos".

Certamente que muito do que emanas hoje, dessa arte que tu transpiras, é também fruto das vivências que tiveste com grandes mestres ao longo do teu percurso formativo... Recordas alguns desses mestres com maior intensidade?
Todos são importantes mas há pelo menos um que me marcou muito... Falo do Paulo Maria Rodrigues que é um pedagogo de excelência, é um artista enorme. Posso também destacar o meu segundo professor de percussão, o Vasco Rodrigues. Com ele aprendi não só música como formas de estar na vida porque ele acompanhou todo o meu crescimento. Destaco também o Miguel Bernat, outro grande artista e com quem eu aprendi muito... Também me marcou pela positiva o meu professor Mário Teixeira e para finalizar o professor Vasco Negreiros que muito me ensinou no campo do "saber ouvir", do "saber interpretar"...

Para além do teu estúdio, do qual já falámos, criaste também a tua própria etiqueta. Faço a mesma pergunta. É uma etiqueta para ti ou também se destina a outros músicos, a outros artistas?
É uma etiqueta para mim e para quem tiver música onde eu vislumbre substância. Eu já editei por muitas editoras e acho que chegou o momento de eu fazer a minha própria editora, para lançar o meu próprio som e para que a própria editora construa o seu som exclusivo. A Editora tem duas secções distintas. A You Feel You que é uma editora de House, ou seja, vocacionada para a pista de dança e a You Plug Me mais dedicada à música eletrónica que se ouve em casa. Esta última dedica-se a coisas mais experimentais, coisas para o ouvinte descobrir...

António BastosPara além da música que partilhas tocando, também partilhas conhecimento dando aulas?
Sim. Estou a dar aulas na Ourearte que é um conservatório de música que está ligado ao ensino artístico. Sou também diretor pedagógico da musica.com que é uma escola que se constitui como uma alternativa ao conservatório onde se pode aprender a estar na música de uma outra forma que não seja "conservadora". Lá pode-se aprender piano à maneira e ao ritmo do aluno ou aluna. Na musica.com aprendem-se também as novas linguagens musicais tais como a eletrónica, o rock, o fado... É uma alternativa ao conservatório onde se vive um ambiente de grande inspiração artística. Quero com isto dizer que, por exemplo, nas audições tentamos montar mesmo um espetáculo onde haja um fio condutor sem mudanças de estante e as habituais paragens das audições convencionais. Há vídeos que podem ser rapidamente encontrados na internet que mostram as nossas audições da escola de música da musica.com.
Para além da minha carreira docente, sou ainda maestro do Orfeão de Vagos. É um Coro que oscila entre as 35/40 pessoas no qual tento também introduzir inovação. Não quero fazer mais do mesmo. Tudo o que tento fazer tem que conter inovação.

Não deve ser fácil conciliar todas as frentes em que te encontras envolvido...
Não é fácil mas com uma boa equipa, tudo se torna mais concretizável.

Tens uma equipa a trabalhar contigo na editora e no estúdio?
Na parte da editora, tenho alguns colaboradores mas no estúdio está tudo muito centrado em mim.

António BastosE num futuro próximo, onde podes ser ouvido?
Em breve estarei no formato Live DJ, ou seja, a tocar mas também fazendo o papel de DJ. As bases vão gravadas pois da maneira que as coisas estão não há verba para pagar a outros músicos, embora o conceito de DJ seja esse mesmo. Neste formato é importante percebermos aquilo que as pessoas estão a sentir. Temos que perceber para onde a pista quer ir. É óbvio que esta cedência tem um limite que encerra na criatividade e arte do DJ... Juntar a isto um músico a tocar ao vivo dá toda uma envolvência muito mais entusiasmante à pista... Quanto a datas, posso dizer que vou estar a 10 de maio no Saramago em Estarreja no formato Live DJ, a 7 e 8 de junho estarei no Festival FIMU em Belfort (França) no formato Live Show.

Para terminarmos, pedíamos que nos dissesses que sonhos ainda tens por concretizar...
O sonho é e será sempre chegar às pessoas, o que neste país é difícil... Eu esforço-me por isso mas temos um país de cultura difícil... As pessoas não têm culpa porque a cultura não lhes chega. Não temos meios para lhes chegar. Quando ligamos a rádio ouvimos sempre o mesmo. A Rádio Comercial enche a barriguinha dos seus ouvintes com música comercial e ainda por cima do mesmo tipo... A RFM, ... só muda o nome... Temos que fazer aqui uma ressalva pois temos a Antena 3 da RDP à qual agradeço muito, porque me está a apoiar e porque tem essa enorme vontade de fazer aparecer novos artistas. Quero deixar bem vincado nesta entrevista que agradeço muito o trabalho que a Antena 3 está a fazer. Outra rádio da qual eu gosto muito mas que infelizmente só passa em Lisboa é a Rádio Oxigénio. Apoia a nova música e é uma rádio pela qual eu tenho muito carinho. Mais a norte, no Porto, admiro muito a Rádio Nova.

Muito obrigado mais uma vez por nos teres recebido para esta agradável conversa.
Eu é que agradeço e aproveito para vos dar os parabéns pelo trabalho que têm vindo a desenvolver em prol da música e dos músicos. Não posso acabar sem lembrar que a minha editora, You Plug Me, vai editar em breve o primeiro tema do projeto "Crassh" do meu amigo e grande músico Bruno Estima. Estejam atentos! Aproveito também para dizer que, a 26 de maio, irá sair uma nova música minha. Será uma música muito "fresca" com influências do house, da world music e muitas outras onde utilizo escalas árabes, ciganas, etc.
Para terminar, posso dizer que a aposta na música foi a opção certa. Não me via a fazer outra coisa... Até podia ganhar mais noutra área mas não seria uma pessoa feliz. Temos que estar neste mundo para sermos felizes. Aliás, se todos fizéssemos aquilo de que gostamos, não existiriam metade dos problemas que hoje existem no mundo.

António Bastos

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