Marina Pacheco. As óperas, os concertos e os prémios já conquistados passados em revista aqui no XpressingMusic.
A lista de óperas em que tem participado diz bem a intensidade do trabalho de Marina Pacheco. Em 2013, A Laugh to Cry de Miguel Azguime, no Teatro São Luiz em Lisboa e foi Princesse, em L'enfant et les Sortilèges, de Ravel no Teatro Helena Sá e Costa no Porto. Em 2012 foi Inês, em A Africana de Giacomo Meyerbeer, numa adaptação da Companhia de Teatro Cão Solteiro e Vasco Araújo no Teatro Maria Matos em Lisboa; Páris, em Páris e Helena de Christoph Willibald Gluck no Teatro São Luiz em Lisboa e no Theatro Circo em Braga, Cunegonde, em Candide, de Leonard Bernstein, numa adaptação de José Lourenço no Teatro Diogo Bernardes em Ponte de Lima. Em 2011 já tinha sido Kristin, em Julie, de Philippe Boesmans em Gent na Bélgica. Marina Pacheco fez em 2009/2010 uma tournée pelo norte do país dando corpo a "Teresa" em Amor de Perdição, de João Arroyo... Marina Pacheco não esquece aqueles que foram os seus mestres. Por outro lado, o seu mérito também tem vindo a ser reconhecido como mostram os vários prémios obtidos e as bolsas que lhe foram concedidas. A nossa convidada foi bolseira do Santander e da Robus Foundation e atualmente é bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian (Prémio Jovens Músicos e enquanto elemento da ENOA – European Network of Opera Academies).
XpressingMusic (XM) – Marina, muito obrigado por este tempo que agora dedica aos leitores do XpressingMusic. Para além das óperas que acabámos de referir, há mais alguma ou algumas que tenham significado especial para si?
Marina Pacheco (M.P.) – Obrigada pelo vosso contacto. É um prazer responder à vossa entrevista.
Todos os papéis que interpretei foram especiais, não só pelo crescimento artístico e pessoal que me proporcionaram, mas também pela possibilidade de conhecer outros artistas e outras realidades artísticas. Para além das óperas que já abordaram, foi muito gratificante também vestir a pele de Susanna em Le Nozze di Figaro de W.A.Mozart, pois tinha apenas 19 anos quando o interpretei. Também a produção de Hänsel und Gretel de E. Humperdinck, numa versão portuguesa da associação "Contos com Voz", onde fui Gretel/Maria foi verdadeiramente entusiasmante pela entrega de toda a equipa!
XM – Para além da Casa da Música, da Casa das Artes em Famalicão, do teatro Diogo Bernardes em Ponte de Lima, do Teatro Nacional de São Carlos, do Grande Auditório da Gulbenkian e da própria Antena 2, a Marina já atuou em palcos internacionais... Pode dizer-nos que países já visitou profissionalmente enquanto performer?
M.P. – De facto a minha carreira permite-me visitar imensos países a fazer o que mais gosto! Estive em Espanha, em Itália, na República Checa, na Bélgica, na Polónia e na Suécia, e conto, em breve, sair do continente. Apresentei-me em diferentes palcos dentro de cada país e foi curioso constatar como os públicos são tão característicos. Por exemplo na Suécia, uma manifestação calorosa do público é equivalente a uma salva de palmas algo tímida em Portugal.
XM – Já conquistou vários prémios... Quais são aqueles que guarda na galeria dos "inesquecíveis"?
M.P. – É claro que um prémio é especial por si só, mas se tiver que destacar é impossível não referir o primeiro - onde fui galardoada em Itália, como finalista mais jovem - e o último, pela sua importância. Vencer o Prémio Jovens Músicos na Categoria de Canto – nível superior, foi, sem dúvida, uma honra. A oportunidade de voltar a pisar o palco da Fundação Calouste Gulbenkian e ser dirigida pela fantástica Joana Carneiro, acompanhada pelos músicos da Orquestra Gulbenkian foi mágica. O público foi extremamente caloroso e as reações muito positivas.
XM – Pedro Telles, José de Oliveira Lopes, António Salgado e Sofia Serra são algumas fontes que certamente a influenciaram e que muito contribuíram para a construção da Marina Pacheco enquanto artista. Consegue distinguir em que medida e em que aspetos sofreu mais influência de cada um deles?
M.P. – É muito difícil conotar qualitativamente a influência destes quatro professores na fase de construção académica da minha voz e carreira. Todos eles foram responsáveis por aquilo que sou hoje, cada um em aspectos diferentes, mas com um nível de importância semelhante, se é que posso abordar a questão desta forma.
O barítono Pedro Telles é o verdadeiro "culpado" de eu ter escolhido este percurso. Foi ele que me apresentou, desafiou e empurrou para esta carreira. Foi ele que me mostrou a seriedade e a diversão de uma escolha destas. Um paradoxo que vivo diariamente, lembrando-me sempre dele. Tornou-se, aliás, um dos meus melhores amigos.
O Professor José de Oliveira Lopes é uma figura única. Custa-me particularmente referir-me a ele, por ter partido há tão pouco tempo. Felizmente tive a oportunidade de estar com ele uma semana antes da sua partida e, mais uma vez, me encheu a alma com as suas histórias de vida do cantor formidável que foi! A última conversa foi sobre um concurso onde era jurado e fez vencer a soprano Renée Fleming!!!!
Por sua vez, António Salgado e Sofia Serra, fizeram parte de um processo muito bonito de mestrado, durante o qual gravei o disco "João Arroyo: obra integral para canto e piano" com a pianista Joana David. Os dois apostaram em mim desde sempre, dando um incentivo constante a concorrer para escolas no estrangeiro e a arriscar um futuro profissional internacional.
XM – A sua experiência de integrar o Vlamsee Operastudio na Bélgica foi muito importante?
M.P. – Foi verdadeiramente importante integrar o Estúdio de Ópera da Flandres, em Gent. Foi na altura ideal. Tinha terminado o meu mestrado com 24 anos e faltava-me essa ponte para o mundo plenamente profissional. Este estúdio trabalha de uma forma muito peculiar que, curiosamente, foi ao encontro daquilo que acredito ser uma via para a música: sair do standard e do óbvio, sem nunca cometer excessos. Durante um ano pude experimentar conceitos artísticos diferentes e muito interessantes, conheci artistas com visões bem desafiantes da arte e da música e pude conhecer-me melhor enquanto cantora e ser humano, ajudando-me a perceber (ainda que em pequena escala) as dificuldades inerentes a uma carreira como cantora lírica.
XM – Em que se traduz o acompanhamento profissional do maestro Marc Tardue?
M.P. – O maestro Marc Tardue acompanhou-me num processo de transição muito importante. Foi muito especial trabalhar com ele, pois tem uma visão bem alargada do canto, do mundo da ópera em particular e da música em geral. Já não o consulto com regularidade, pois, mais uma vez, estou numa nova fase de construção artística e sinto agora a necessidade de um trabalho mais intenso com uma voz feminina. É um processo que começarei muito em breve, tendo já tudo delineado.
XM – A Marina Pacheco apresenta-se frequentemente em recital com a pianista Olga Amaro. Podemos dizer que se trata de uma parceria de sucesso?
M.P. – Nós queremos acreditar que se trata de uma parceria de entrega à música! Trabalhamos muito e somos muito enérgicas. Temos vontade de arrojar e fazer projetos inovadores. Um deles foi, precisamente, o disco "Canções de Lemúria".
Acredito que o facto de termos sido apresentadas numa altura em que procurávamos as duas o mesmo - alguém com quem construir um trabalho musical sólido e regular -, nos levou a agarrar este projeto com afinco e a lutar por ele. Em dois anos e dois meses já realizámos inúmeros recitais em Portugal e no estrangeiro, criámos projetos diferentes – como "Viagem a Buenos Aires", "A Canção e a Ópera" ou "Marina Pacheco & Olga Amaro em recital", etc. – e gravámos um disco. Temos a convicção de que damos o nosso melhor e de que gostamos de fazer música juntas. Por outro lado, sabemos que queremos crescer ainda mais como artistas e procuramos trabalhar com quem possa permitir isso, não só do ponto de vista musical, mas também teatral e, muito importante, humano.
Se isso for significado de uma parceria de sucesso, ficamos muito honradas e com uma sensação enorme de recompensa pela aposta constante que fazemos na nossa carreira.
XM – Fale-nos agora um pouco da sua participação no disco "João Arroyo: obra integral para canto e piano".
M.P. – "João Arroyo: obra integral para canto e piano" foi o meu primeiro disco e, naturalmente, tem um significado muito especial para mim. Gravei com uma pianista maravilhosa, a Joana David, com quem cresci musicalmente durante a preparação e estudo a fundo das peças!
Na realidade, estava inscrita no mestrado na Universidade Católica – Foz e, embora tivesse em mente diversas possibilidades de temas para a tese, nenhuma me estava a convencer. Fiz as provas para a produção "Amor de Perdição" de J. Arroyo e, ao ser escolhida para interpretar a Teresa, fui obrigada a mergulhar na música de João Arroyo (de quem só conhecia uma simples peça para canto e piano). Deixei-me encantar e resolvi pesquisar mais sobre este compositor. Descobri que tinha 21 canções para canto e piano e aquele pareceu-me ser o tema perfeito para um mestrado em performance.
Seguiu-se um período intenso de pesquisa, conversas e, o mais difícil, de tentativa de descobrir os manuscritos, dos quais não se sabia o paradeiro. Aqui, a Biblioteca Nacional em Lisboa, teve um papel muito importante, tendo encontrado todo o material de que eu necessitava.
Depois do trabalho de transcrição, por Osvaldo Fernandes, e revisão, por Christine Wassermann Beirão, foi possível passar à construção musical das obras e posterior gravação.
Foi um trabalho árduo, mas muito recompensante. Conheci, mais tarde, parte da família do compositor e sinto que deixei o meu contributo para o registo da música portuguesa.
XM – Há algum disco ou projeto para breve que queria partilhar?
M.P. – Acabei de lançar o meu mais recente disco "Canções de Lemúria" que está à venda nas FNAC (http://www.fnac.pt/-Cancoes-de-Lemuria-sem-especificar/a726991) e nas plataformas online como iTunes (https://itunes.apple.com/pt/album/cancoes-de-lemuria/id730871892). Foi um projeto que exigiu muito de mim e da pianista Olga Amaro, em conjunto com o ator e encenador Pedro Lamares. Para já, não está previsto um novo disco para breve, mas há muitos outros projetos que começam a ser estudados e preparados.
Estarei em Março no Centro Cultural de Cascais a estrear uma obra de Alexandre Delgado escrita para mim e para o Sond'Art Electric Ensemble (uma produção Miso Music Portugal) e, logo depois, estrearei um recital com o violoncelista Fernando Costa e a pianista Olga Amaro. Teremos um roteiro de concertos com um programa bem interessante.
Há ainda dois projetos arrojados que subirão a palco. Um será recuperado pela equipa Elenco Produções, uma vez que foi apresentado há cerca de um ano e meio pela primeira vez em Ponte de Lima, sendo um sucesso de bilheteira: "Viagem a Buenos Aires". O outro, será construído de raiz e trata-se de uma ópera-monólogo que é bastante desafiante para mim enquanto cantora e atriz, tanto do ponto de vista musical como do ponto de vista cénico. Para além disso, a equipa de produção, técnica e artística é muito exigente e está habituada a padrões de qualidade elevados. Algo que será revelado a seu tempo.
Pelo caminho há ainda diversos recitais e uma Gala de Ópera e a definição de ideias e conceitos para futuros projetos. Gosto de preparar com calma e tempo, sempre que possível, o que me proponho fazer!
Toda a informação é sempre actualizada em www.marinapacheco.com e www.facebook.com/marinapachecosoprano.
XM – Muito obrigado por este tempinho que nos dedicou... Para terminar gostaríamos de lhe perguntar se considera que Portugal tem espaço para que os nossos jovens músicos façam carreira. Ir para fora é uma inevitabilidade, como muitos afirmam?
M.P. – Obrigada eu! De facto, neste momento, não acredito que haja espaço para tanto talento, porque há falta de oferta. Os nossos músicos são, cada vez mais, músicos de excelência. Investem a todos os níveis na sua formação e arriscam. Para além disso, acredito honestamente que os valores estão a mudar e que há um lado humano que se tem vindo a manifestar mais e mais entre os artistas. Defendo que esse deve ser um dos princípios para se fazer música. Estamos a falar de arte e esta não permite sentimentos menos nobres e preocupações que ultrapassem o fazer única e exclusivamente ARTE! Preferia que fosse possível ver o mundo como um espaço aberto de possibilidades para concertos e realização profissional. Neste momento vê-se o estrangeiro como solução para uma carreira. Tenho pena! Acredito que Portugal é um país cheio de potencialidades, mas, infelizmente, ainda não as sabe aproveitar!!!
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