Entrevista ao trompetista Jorge Almeida

Jorge AlmeidaO nosso convidado de hoje é um músico que dispensa apresentações. O trabalho que desenvolve na Orquestra Sinfónica Portuguesa, no Grupo de Metais do Seixal e ainda dentro deste grupo a organização das XIII e XIV Master classes do Seixal no qual participam os mais prestigiados músicos de metais do Mundo é ímpar e reconhecido por toda a comunidade musical. Jorge Lourenço de Sousa Almeida acompanhou, desde tenra idade, o seu pai, Jaime, prestigiado fliscornista no âmbito das filarmónicas. Começou a tocar a solo mesmo antes de iniciar os seus estudos musicais no ensino oficial. Desde cedo mostrou facilidade e à vontade em assumir o papel de solista, independentemente de qual fosse o público.

XpressingMusic (XM) – Jorge, agradecendo desde já a sua amabilidade para com os leitores do XpressingMusic. Começamos esta entrevista com a seguinte questão: O facto de ter iniciado os seus estudos musicais em trompete sob a orientação dos professores Fernando Baptista e José Macedo, foi muito significativo e um forte contributo para ter chegado ao patamar performativo que alcançou e de que é detentor hoje em dia?

Jorge Almeida (J.A.) – Em primeiro lugar, eu é que agradeço a amabilidade do XpressingMusic ao me formular esta entrevista. E com isto, estar por certo a contribuir para algumas curiosidades para com os leitores sobre a minha verdadeira aventura numa área que, por natureza no nosso País, ainda é considerada, embora não tanto quanto a década de 80, "minha década de iniciação", uma ocupação de tempos livres ou também, quem não tem jeito para mais nada, enfim... tudo, menos chamar-lhe vocação numa área que requer talento, dedicação, espirito de sacrifício e honestidade e inteligência.
Quanto à questão que me é colocada, é o seguinte. Eu considero que depois do meu Pai, o primeiro impulsionador aos desígnios da música, todos tiveram um lugar de importância na minha formação. Sem dúvida que os primeiros são sempre os verdadeiros alicerces para o projeto e estes grandes Senhores foram extremamente competentes e honestos. Estarei sempre e eternamente grato ao serviço prestado na música em Portugal, por estes grandes Senhores.

Jorge AlmeidaXM – Em 1987 foi convidado a efetuar um Concerto no Atneu Comercial do Porto. Era já o justo reconhecimento do valor do Jorge Almeida? O que sentiu nesta altura?

J.A. – Não... Eu ainda era um projeto e este concerto foi-me oferecido como um prémio, por ter ganho o concurso para jovens solistas de nível médio PJM, liderado então pelo Dr. Miguel Henriques, diretor da Juventude Musical Portuguesa.
Sem dúvida que tem um propósito muito especial. É que foi a primeira vez que um trompetista jovem do Norte ganhou um primeiro prémio neste instrumento a nível Nacional, passando inicialmente por uma seleção forte a nível Regional. E, como forma de mostrar à grande elite apreciadora de concertos cujo os instrumentos solistas mais escutados na altura ainda eram os Pianos, Flautas transversas e cordas, aí está uma oportunidade para me revelar e mostrar os potências deste instrumento. Mas foi sem dúvida para mim uma grande responsabilidade e desafio, confesso.

XM – O convite do Sr. Major Silvério de Campos para ingressar na Banda Sinfónica da P.S.P. surgiu em que altura?

J.A. – Este episódio foi muito interessante e marcante na minha vida musical e também já a nível profissional visto que nesta altura já era um militar de carreira, pois estava no Exército na especialidade de músico da Banda militar, cuja sede era o regimento de infantaria de Queluz.
Perguntar-me-ão os leitores, o que estaria eu a fazer no Exército se, e pela História das questões anteriores, o futuro que parecia risonho como um estudante exemplar, talentoso e com vocação de repente mudou!
Pois nesta década, não existiam em Portugal as escolas profissionais e muito menos o curso Superior de performance neste instrumento e estamos a falar inícios da década de 90, como tal as Bandas militares eram até então o garante da profissão para aqueles que, como eu, aspiravam ter possibilidades de não parar de estudar ou de pelo menos ter condições financeiras para poder obter aulas privadas com grandes instrumentistas Internacionais.
Ora, estando eu no 20º Curso de formação de Sargentos, foi-me proposto pelo Exmº Sr. Major Sllvério de Campos, atual chefe e maestro da Banda Sinfónica da PSP, o lugar de chefe de naipe dos trompetes da já referida banda. Isto vem numa altura em que a Banda estava num patamar de exigência artística maior do que a que eu auferia de momento no Exército. Pois esta banda, para além do seu grau de exigência, tinha também como princípio, apoiar o desenvolvimento do executante, deixando espaço à tarde para ele estudar nos ensinos oficiais de música, quer fosse no conservatório Nacional quer fosse, o que veio a acontecer mais tarde, no ensino superior de música. E... vem a acontecer comigo o que sempre tinha sonhado... Estudar com um grande pedagogo de nível superior.
Nasce nesta mesma altura o projeto fantástico da ANSO, (Academia Nacional Superior de Orquestra), um projeto inovador com o Maestro Miguel Graça Moura.

XM – A Academia Nacional Superior de Orquestra e nomes como Douglas Stephenson, David Burt, Robert Chambers e Philip Navat entram mais tarde na sua vida. Foi um momento de viragem relativamente ao que produzia e ao que estudava? Foi a procura de novos conceitos e de novas abordagens?...

Jorge AlmeidaJ.A. – Com esta divina sorte, vejo-me a realizar muitos dos meus sonhos. Foi sem dúvida um momento de viragem. Tudo o que um estudante de música necessita, eu encontrei lá. Paz, literatura musical disponível, ter um espaço 24h aberto para poder estudar e encontrar uma Orquestra fabulosa, com músicos fabulosos das maiores Universidades do Mundo, que eram os próprios pedagogos de performance, regras que eram impostas pelo já falecido Dr. João Pinheiro formado no Conservatório Superior de Paris, Grandes Maestros, enfim... algo que deixou de existir após a minha formação nessa escola. Hoje vejo a continuidade do projeto, mas, com muitos menos recursos de outrora. E como diz o ditado, (sem ovos não se fazem ...).

XM – Tocar e lecionar em Macau foi outra oportunidade que surgiu no decorrer da sua carreira... Como surgiu a oportunidade? Gostou da(s) experiência(s)?

J.A. – Foi aquando um concurso Internacional para recrutar músicos para a formação da Orquestra de câmara de Macau.
Concorri e ganhei o lugar. Mas depois de analisar o que seria melhor para mim na altura como por exemplo, continuar a estudar e evoluir com o meu Prof. Douglas Stefhenson ou ter um bom salário mas estagnar porventura... São opções de que não estou nada arrependido.

XM – Como aparece a oportunidade de participar na gravação do musical da "EXPO 98"? Esta foi uma época de muito trabalho, não foi?

J.A. – Quando falo na "EXPO 98" no meu CV, acho que tem a ver com um acontecimento marcante para com todos os Portugueses em geral e, claro está, eu não fujo à regra e ainda para mais fazer parte da música que começa com o som de dois trompetistas, eu mesmo e David Burt e a Orquestra que me educou e me acolheu como profissional... Este foi um Ano sem dúvida de muito boas emoções... Ficará para uma próxima oportunidade falar de muita coisa boa ocorrida neste Ano de 1998 para mim.

XM – Ainda a propósito de gravações, sabemos que já participou em várias, tanto para a RDP-Antena 2, como para etiquetas como a EMI e Marcopolo. Gosta do trabalho de estúdio?

J.A. – Adoro o trabalho de estúdio. Pena é que não haja os apoios necessários para ajudar projetos de muitos bons músicos que temos no nosso País, é uma pena que assim seja.
Quando um artista grava, é como estar a desenvolver um embrião. É termos a esperança que alguém que nos escuta através do áudio se reveja em algo que gostaria de ser ou de poder viver.
Infelizmente ainda não gravei um CD totalmente meu, mas estará para breve.

XM – A participação em Bandas Sonoras de anúncios publicitários, é algo que lhe agrada?

Jorge AlmeidaJ.A. – Bandas sonoras para filmes sim, quanto aos anúncios publicitários... eles são feitos agora por máquinas. Na altura era algo em que o músico ainda podia faturar, agora não. No entanto as bandas sonoras são o que mais me fascinaria fazer, porque ainda continuo a ser um sonhador e a sétima arte está sempre presente no momento da minha criação musical.

XM – Para além do Jorge Almeida, performer, temos o pedagogo. Considera que ambas as facetas se complementam? Quais os principais cursos que ministrou?

J.A. – Ambas as facetas se complementam claro. Quando um performer não encontra barreiras de evolução não pode voltar as costas ao Mundo da partilha. Partilhar as experiências vividas é algo que não se traduz em manuais. Conduzir o caminho dos mais jovens talentos é nunca sentirmos que estamos a caminhar na idade. Eles são também o nosso Oxigénio, são fruto da exigência de laboratório, para que consigam ser sempre músicos mais refinados, melhores obras de Arte.
Quanto aos cursos por mim ministrados, já lhes perdi a conta. Não tenho uma resposta que possa dizer os principais. Todos têm sido gratificantes.
Como costumo dizer, já semeei desde Portugal de Norte a Sul, Espanha, Brasil e todas as minhas passagens como performer um pouco por todo o Mundo, mesmo que não ministre um curso, deixamos sempre algo.

XM – O Jorge Tem dado um grande contributo para a evolução dos trompetistas portugueses não só transmitindo a sua experiência nas aulas e master classes que ministra mas também nos cursos que organiza. Se tivesse poder para mudar algo no âmbito da formação artística em Portugal, quais seriam os seus primeiros passos e medidas?

J.A. – Começaria por modernizar as nossas escolas desde o ensino básico às Universidades. Estou a referir-me em especial ao ensino Público.
Dar oportunidade a todas as classes sociais de sentirem o prazer que é e o bem que faz o ensino da música, como componente letiva de excelência, ao desenvolvimento cognitivo.
Modernizar o programa, tornando-o mais sério.
Olhar para um professor de música com o mesmo respeito que se olha para todos os outros de outras áreas, (só no nosso País é que isso não acontece).
Aumentar o investimento do Estado pelo menos para 2% do PIB em relação à cultura.
Acho que não é pedir mais do que dignidade e respeito.

XM – Quais os reportórios com os quais mais se identifica? Reportório clássico? O Jazz?...

J.A. – MÚSICA.
Cada vez mais o músico tem que se identificar com a maior abrangência de estilos. A versatilidade traz evolução, traz vida. É o elixir perfeito para nos sentirmos sempre frescos e saudáveis na sua prática.

XM – Agradecemos mais uma vez ter aceitado o nosso convite. Há projetos novos para breve que possa partilhar com os nossos leitores?

J.A. – Claro que sim!
A gravação do meu primeiro CD integral a Solo.
A minha participação no segundo CD de originais de Marco Barroso em Jazz (LUME Big Band)
A Gravação do primeiro CD do meu novo projeto com um quinteto de metais "Portuguese Brass Quintet".
Isto tudo já para 2014.
Obrigado e foi um enorme prazer poder partilhar estes pequenos belos momentos convosco.
Até breve.

Jorge Almeida

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