Nana Sousa Dias no XpressingMusic...

Nana Sousa Dias @ XpressingMusicNasceu em Torres Vedras e desde cedo demonstrou interesse pela música. Tocou com inúmeros artistas e a solo. No seu portfolio estarão certamente as recordações dos intensos anos 80 em que tocou com Lena D’Agua, Rui Veloso, entre outros nomes da música portuguesa. O Jazz foi sempre uma inspiração, daí ter sido convidado várias vezes por Luís Villas-Boas para tocar nos Festivais de Jazz de Cascais, Estoril e Lisboa. Outra paixão que tem para além da música é a fotografia. Pensamos não estar longe da verdade quando dizemos que ao observarmos alguns dos seus trabalhos fotográficos, nos vem à cabeça o som do seu saxofone como música de fundo… e a sugestão contrária também é algo que se apodera de nós como se vislumbrássemos imagens e cenários quando escutamos o brilhantismo que nos consegue transmitir em notas longas carregadas de emoções, de sentimentos…

XpressingMusic (XM) – Nana, muito obrigado por nos dedicar este bocadinho do seu precioso tempo. É verdade que a música aparece na sua vida por influência direta do seu pai e de outros familiares? Porque optou pelo saxofone?

Nana Sousa Dias (N.D.) – Sim, é verdade, além do meu pai, todos os meus tios, e meu avô paterno, tocavam algum instrumento, o meu bisavô era flautista de orquestra, a minha mãe teve aulas de canto e fez exames no conservatório de Lisboa, embora tivesse aulas particulares em Torres Vedras. Uma tia minha, irmã da minha mãe, era professora de piano. Sempre vivi rodeado de música. No entanto, eu não escolhi o saxofone, inicialmente, comecei por aprender guitarra, aos 13, depois, aos 19 comecei a estudar flauta transversal e só aos 23 comecei a estudar saxofone tenor, sempre como autodidata.

XM – Com que idade se começou a interessar pelo Jazz?

N.D. – Comecei a interessar-me primeiro pela Bossa-nova e pela MPB. Só mais tarde, penso que por volta dos 18 ou 19 me comecei a interessar pela Fusão, Funky e Jazz.

Nana Sousa Dias @ XpressingMusicXM – Quando surgem os Bit? Pode falar-nos um pouco deste projeto e dos elementos que o constituíam?

N.D. – Os Bit surgiram em 1983. Foi um projeto criado por mim, pelo Manuel Paulo (Ala dos Namorados, pianista), Paleka (baterista), Luís Stoffel (guitarrista) e Zeca Neves (baixista). Eu tinha passado recentemente da Banda Atlântida de Lena d’Água, para a banda do Rui Veloso. O Zeca Neves fazia parte da Banda Atlântida e o Manuel Paulo e o Paleka, estavam então, na banda do Rui Veloso. Eu tinha alguns temas instrumentais, bem como o Manuel Paulo e também o Luís Stoffel, então, resolvemos juntar os “trapinhos” e criámos esta banda, com a qual gravámos um LP para a EMI-Valentim de Carvalho, em 1984. Tivemos algum sucesso e ganhámos um prémio de “Melhor Banda de Música Moderna” em 1985 se bem me lembro.

XM – O seu primeiro disco a solo foi editado em 1986 e chama-se "Ousadias". Considerava-se um “Dias ousado” nesta altura? Quem eram os músicos que o acompanhavam na “Ousadia”?

N.D. – Bem, precisamos de nos reportar à época. Muito pouca gente conseguia gravar música instrumental, nessa altura. Além do título ser uma brincadeira utilizando o meu apelido, era, na realidade algo ousado pegar em temas cuja letra era tão importante e fazer versões instrumentais. Estamos a falar de algumas canções de intervenção de músicos como o Zeca Afonso, Zé Mário Branco, Sérgio Godinho, Fausto, etc…Uma curiosidade é o facto desse disco ter sido, então, proibido de passar na Rádio Renascença, apesar de não ter qualquer palavra cantada. Tal era a celeuma que se criava em torno da menção de tais autores, naquela rádio. Foi um episódio perfeitamente ridículo, proibir os radialistas de passarem um disco instrumental, ainda por cima 12 anos depois do 25 de Abril de 1974 e no ano em que entrámos na Comunidade Europeia!

Na gravação do disco participaram o Ramon Galarza (percussões e teclados), o Zé Moz Carrapa (guitarra e teclados), o Zé Nabo (Baixo) e o Renato Júnior (teclados).

XM – Em 1988 traz-nos o álbum "Aqui Tudo Bem". Era assim que se sentia na altura? Estava mesmo tudo bem? Seria este um momento de paz entre o artista e aquilo que produzia?

N.D. – “Aqui tudo bem” era o título de um tema que compus dedicado à minha ex-mulher, a Rosário Moreira que, nesta época (ainda não éramos casados) trabalhava no Parlamento Europeu, no Luxemburgo. Nós correspondíamo-nos por carta e, por vezes, por telefone. “Aqui tudo bem” era como que o princípio duma dessas cartas, o que também continha implicitamente, alguma saudade.

XM – Muitos dos que nos seguem lembrar-se-ão do genérico da série televisiva “Claxon” que foi composto pelo Nana. Como surgiu esta oportunidade?

N.D. – Não me lembro muito bem como isso aconteceu, mas, penso que foi através da Polygram, com quem eu mantinha contrato discográfico, nessa época. No entanto se bem me lembro eu participei no genérico e na banda sonora mas acho que não fui eu que compus o genérico…sinceramente, não me lembro bem disso, a memória já vai falhando.

Nana Sousa Dias @ XpressingMusicXM – A sensação que temos quando ouvimos o Sax do Nana é a de que nos consegue remeter para o exato contexto das letras das canções que está a acompanhar/”ilustrar”. O “Cai neve em Nova York” do José Cid é um exemplo claro disso. É intencional, estudado ou simplesmente, “acontece”?

N.D. – Eu tenho muita dificuldade em interpretar esse tipo de afirmações, no entanto, posso dizer que, muito provavelmente, a coisa acontece naturalmente, pois não me lembro de alguma vez ter “estudado” um modo de criar uma interligação entre os meus solos e as letras das canções.

XM – Os anos de 1994 e 1995 foram anos de intensa produção com os trabalhos "Salsetti" de Bernardo Sassetti e a homenagem que fez a Tom Jobim com o álbum “Tom Maior”. Mesmo assim ainda conseguiu tempo para nos presentear com um disco de Natal. Descreva-nos um pouco estes trabalhos…

N.D. – Bem, além do primeiro álbum do Bernardo Sassetti, produzi ainda nessa época, o álbum da Big Band do Hot Clube de Portugal, um álbum do Carlos Barretto, o primeiro álbum dos Moreiras Jazztet, o primeiro álbum da Maria Anadon, um outro do Laurent Filipe, isto com a participação de vários nomes importantes do jazz mundial, como Paquito D’Rivera, Freddie Hubbard, Curtis Fuller, Bennie Golson, Bob Sands, Ali Ryerson, Greg Bandy, etc. Ainda nesta época produzi um disco com o saxofonista Rick Margitza, um com o pianista George Cables e um outro com o saxofonista Steve Slagle. Ainda produzi 2 discos gravados ao vivo, um no CCB, com a participação do trompetista Eddie Henderson e Perico Sambeat e um outro no Festival de Jazz de Guimarães com o Trombonista Conrad Herwig. Foram 2 anos de produção intensa, contando com a colaboração dos irmãos Moreira e do Hot Clube.

XM – A carreira do Nana Sousa Dias é imensa e certamente não conseguimos abordar aqui todos os trabalhos em que já participou, mas não podíamos deixar no entanto de versar o lado mais pedagógico e aproveitar os seus contributos enquanto músico experiente. Sabemos que partilha da opinião de Dave Kessler expressa na fórmula “Som do Saxofone = 6% boquilha + 4% saxofone + 90% saxofonista”. Esta é uma máxima que deve fazer tremer as grandes marcas de saxofones… Por outro lado é algo que remete o músico para a consciencialização da responsabilidade que deve assumir enquanto profissional. Estudar… Estudar… Estudar… Concorda?

N.D. – Uma vez alguém perguntou ao saxofonista Michael Brecker qual a boquilha e palheta que ele usava, ao que ele respondeu: “- oito horas de estudo por dia!”

Nana Sousa Dias @ XpressingMusicPreciso de esclarecer uma coisa…um bom saxofone é mais fácil de tocar do que um mau, logo, apesar do saxofone não ter muita influencia no resultado final, em termos de som, dá muito mais trabalho lidar com um mau instrumento do que com um bom. Quanto à tal “fórmula” do dave Kessler, eu concordo com ela em termos gerais, mas, não sei se aquelas percentagens serão muito “científicas”. Tal como acontece, por exemplo, com as guitarras elétricas e outros instrumentos, os saxofones bons não fazem só por si com que os saxofonistas toquem bem. Não é o facto de alguém possuir uma guitarra igual à do Pat Metheny que vai fazer com que essa pessoa toque do mesmo modo ou com o mesmo som que o Pat Metheny.

Penso que ninguém consegue tocar bem um instrumento se não o estudar…hoje em dia existem muitos músicos com um nível técnico muito alto, existem muito mais escolas do que no tempo em que comecei a tocar. Existem muitos mais instrumentos de aprendizagem do que existiam naquela época, nomeadamente, CDs, vídeos, livros, etc. Também existem mais clubes e salas de espetáculos atualmente e uma coisa muito importante para qualquer músico, as jam sessions. Nos últimos 15 anos, o nível técnico dos músicos subiu em flecha no nosso país, o que me dá uma grande satisfação.

XM – A nossa entrevista incidiu de forma marcante no Nana Sousa Dias músico… Mas não iremos embora sem abordar outra arte que abraça e pela qual também é reconhecido pelo público e pelos especialistas. Sim. Referimo-nos à fotografia. A paixão pela fotografia sempre caminhou paralela à da música?

N.D. – Isso é verdade, embora eu observasse mais do que praticava. Só comecei a estudar fotografia e a praticar de um modo mais sério por volta dos 42 anos, ou seja, há 13 anos. No entanto, estudei muito mais afincadamente fotografia do que saxofone, tendência que tenho tentado inverter ultimamente, pois recomecei a estudar saxofone diariamente, desde há cerca de 1 ano.

XM – A fotografia funciona para o músico como uma terapia de relaxamento? Será o inverso?... Ou ambas as áreas se complementam fazendo do Nana o ser humano completo e reflexivo que vislumbramos nos comentários e nas preocupações explanadas no seu blog?

Nana Sousa Dias @ XpressingMusic

N.D. – Para mim, a fotografia e a música não têm qualquer relação, no entanto, elas conjugam-se bem, porque, para fotografar é preciso luz e a música, normalmente, começa depois do pôr-do-sol.

Costumo dizer que as minhas profissões são, também, os meus hobbies. Quando vou para um concerto, levo sempre uma máquina fotográfica comigo e, quando me desloco a qualquer l

ado longe de casa para dar um Workshop de fotografia, levo sempre um saxofone. Em todo o caso, para responder à sua pergunta, ambas as atividades são, para mim, terapias de relaxamento.

XM – Foi para nós uma honra entrevistá-lo pois, certamente, faz parte do imaginário de muitos dos nossos seguidores e da própria equipa do XpressingMusic. Muito obrigado. Como última questão gostaríamos de lhe perguntar se tem projetos musicais para breve que possa partilhar connosco.

N.D. – Neste momento, tenho duas preocupações principais relativamente à música…estudar saxofone e recomeçar a compor, coisa que deixei um pouco de lado, devido à fase em que tinha um estúdio de gravação (que fechei em 2000) e em que me dediquei mais à produção. Neste momento, não tenho qualquer espécie de preocupação em gravar, voltei a formar o meu Sexteto, do qual fazem parte alguns dos músicos originais mas, há também algum “sangue novo”. Estou neste momento e formar também um quarteto com um reportório de Jazz/Funk e faço parte, novamente, desde Novembro de 2012, do grupo do Rui Veloso, com quem comecei a tocar em 1983.

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