Promessas e Programas | A Cultura no programa apresentado pelo XX Governo Constitucional
Dimensão transversal da cultura, cultura e coesão, identidade e património comum, artes, política da língua, arquivos e bibliotecas, são os pontos basilares que norteiam o Programa do XX Governo Constitucional. E se o Governo for outro? O que esperar?
Hoje deixamos aos nossos leitores a transcrição da parte que o Programa do XX Governo Constitucional dedica à cultura.
Num tempo como nunca antes se viveu, sabemos que corremos o risco de ter que apresentar dentro de dias outro Programa de Governo, caso o atual não resista à investida que será provavelmente levada a cabo pela esquerda portuguesa. Até lá, e se tal acontecer, resta-nos ficar com a dúvida relativamente ao que poderá ser diferente nesta área que nos é tão sensível.
Recordamos no entanto que, da parte dos partidos que se perfilam para chegar ao poder através do derrube do governo eleito, as expectativas ficaram altas pois a junção de três programas de esquerda poderão dar uma explosão de medidas para o enaltecimento da cultura.
Apresentamos aqui algumas das promessas a título de exemplo.
O Partido Socialista prometeu em campanha que iria «reforçar os conteúdos de artes e humanidades nos programas curriculares gerais, em todos os níveis de escolaridade, e a sua interação com as demais disciplinas, bem como expandir os programas educativos das instituições culturais». Prometeu também «definir novos modelos de gestão específicos do ensino artístico vocacional, em parceria com as áreas da educação e da cultura». Estes são somente dois exemplos que se juntam aos compromissos de «promover e apoiar a produção de portais e conteúdos digitais que potenciem o acesso dos cidadãos ao património e à criação contemporânea» ou ainda ao da criação de um «Cartão + Cultura, a ser atribuído pelas entidades patronais aos seus trabalhadores para acesso a espetáculos de artes performativas e à aquisição de livros e outros produtos culturais, sendo o valor assim investido considerado mecenato para efeitos fiscais».
Mas, como ficaria um programa de governo de esquerda juntando as promessas de António Costa e do Partido Socialista às da CDU e do Bloco?
Será que o Bloco de Esquerda incorporou no programa do PS as suas promessas? O BE prometia, por exemplo: «universalização do ensino da música no primeiro ciclo do Ensino Básico e programas de fruição artística e cultural, dentro e fora da escola, em todos os ciclos de ensino» e ainda «uma política fiscal que encara a cultura como bem essencial: IVA a taxa reduzida para conteúdos culturais em qualquer plataforma, para partituras e instrumentos musicais, espetáculos e obras de conservação e restauro».
E será que a CDU estará a exigir, no âmbito da cultura, a incorporação das seus compromissos com os eleitores no que diz respeito ao desenvolvimento, qualificação e ampliação da rede pública de ensino artístico? A mesma CDU que pretendia, caso fosse governo, «garantir o acesso generalizado dos trabalhadores e do povo, em todo o território nacional, à experiência da criação e fruição cultural e artística, dando especial relevância à componente do acesso às formas, meios e instrumentos da criação».
O atual Governo eleito e empossado criou o Ministério da Cultura, Igualdade e Cidadania. O mesmo tem como Ministra, Teresa Morais.
Como "prometemos" aos nossos leitores, aqui fica a transcrição da parte relativa à área da cultura, presente no programa apresentado pelo XX Governo Constitucional.
A Cultura é muito mais que o conjunto das políticas culturais de uma tutela ou de um governo, extravasando uma dependência orgânica e atuando em setores como a educação, a economia, a política externa, a inclusão social ou o ordenamento do território. As políticas públicas da área da cultura têm, pois, uma base estratégica na coesão, na soberania e no desenvolvimento do país.
A Cultura é um dos ativos mais valiosos da presença portuguesa no mundo, desempenhando a nossa língua um papel da maior relevância no mundo globalizado.
DIMENSÃO TRANSVERSAL DA CULTURA
O Governo atribui especial prioridade às seguintes dimensões de intervenção:
- Cultura e educação - através do desenvolvimento de programas integrados em todos os níveis de ensino;
- Cultura e economia - reconhecendo a importância do setor criativo como elemento diferenciador na economia global na criação de empregos e de riqueza;
- Cultura e turismo - potenciando as condições de fruição do património cultural edificado, paisagístico, móvel e imaterial;
- Cultura e territórios de baixa densidade - valorizando a proteção do património e a atividade artística nestas regiões do País – promovendo a aproximação às populações, através da inserção em redes nacionais e internacionais;
- Cultura e internacionalização - por via do estímulo ao desenvolvimento de iniciativas de internacionalização das artes performativas e das artes visuais, da literatura e edições portuguesas, assim como da estratégia de internacionalização do cinema e do audiovisual português;
- Cultura e cidadania – como veículo de promoção dos direitos humanos, da inclusão social e da integração das comunidades, concretizada em iniciativas impulsionadoras da diversidade cultural.
CULTURA E COESÃO
À cultura cabe um papel crucial na criação de uma sociedade mais inclusiva e na afirmação do princípio da igualdade de oportunidades. Na realização desse objetivo, assume especial relevo o programa Cultura para Todos, criado no âmbito do Portugal 2020 e a necessidade de:
- Melhorar a participação das diversas comunidades linguísticas e nacionais presentes em Portugal;
- Promover o acesso das populações em termos equitativos à fruição e à criação cultural;
- Desenvolver a articulação dos serviços públicos com as autarquias locais, as empresas e a sociedade, maximizando os recursos disponíveis;
- Reforçar o papel da Cultura enquanto elo de ligação com a diáspora portuguesa, muito em especial no que diz respeito aos luso-descendentes;
- Reforçar os instrumentos de literacia digital para o acesso à Cultura em ambientes virtuais.
IDENTIDADE E PATRIMÓNIO COMUM
É crucial uma permanente atuação no domínio patrimonial e museológico que tenha em conta a sua relevância enquanto elemento para a defesa e afirmação da identidade nacional, mas também o seu potencial para o desenvolvimento económico e social e para a nossa projeção no mundo. Propomo-nos levar a cabo:
- A defesa das várias formas de manifestação do património móvel e imaterial e das tradições orais e da valorização dos nossos museus e da Rede Portuguesa de Museus;
- A defesa da paisagem cultural, urbana ou natural;
- A maior articulação entre administração central e autarquias, com vista à melhoria de procedimentos urbanísticos e de salvaguarda do património;
- A sistematização do trabalho de preservação e promoção do património cultural edificado, móvel e imaterial, em especial dos patrimónios cristão, judaico, islâmico e do património arqueológico;
- A melhoria do conhecimento da nossa história militar, através de um mapeamento atualizado do património militar em Portugal e do património português ou de influência portuguesa no mundo e de uma estratégia para a sua preservação e valorização;
- A definição de um ponto de contacto para o investimento na Cultura – que abranja as candidaturas internacionais, o restauro e requalificação de património classificado - para diminuir burocracia, em articulação com as autarquias locais;
- A revisão da Lei do Mecenato, no âmbito de um alargamento das possibilidades de financiamento à atividade cultural;
- A criação de mecanismo de transmissão do conhecimento especializado nas diversas instituições culturais;
- A concretização da estratégia para a reformulação do estatuto do Museu Nacional de Arte Antiga com vista à sua expansão e consolidação como grande museu nacional e europeu;
- A apresentação permanente do conjunto de Joias e Pratas da Coroa no Palácio Nacional da Ajuda;
- A participação ativa no «Ano Europeu do património cultural 2018.
ARTES
A criação e a fruição artística são determinantes para a qualidade de vida de todas as pessoas. Assim propomos:
- A concretização do estatuto do artista;
- A elaboração de quadros estratégicos plurianuais para o apoio às artes, cinema e audiovisual e para os organismos de produção artística do Estado (teatros nacionais, ópera e bailado);
- O combate à violação de direito de autor e direitos conexos;
- O aumento das competências regionais no domínio do apoio às artes e da descentralização da gestão de equipamentos culturais do Estado;
- A melhoria da articulação entre as áreas da educação e da cultura, nomeadamente, em ordem ao desenvolvimento das escolas artísticas e das atividades artísticas em contexto escolar;
- A melhoria dos mecanismos de apoio às atividades artísticas amadoras;
- A regulamentação/certificação dos modelos de formação e de atividades culturais profissionais e amadoras;
- A revisão do modelo de organização e funcionamento da Direção Geral das Artes e dos seus procedimentos concursais, do Organismo de Produção Artística (OPART), do Instituto do Cinema e Audiovisual e da Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema.
POLÍTICA DA LÍNGUA, ARQUIVOS E BIBLIOTECAS
É na nossa língua que encontramos um dos mais poderosos patrimónios da Cultura portuguesa. É nos nossos arquivos nacionais e distritais que se encontra o repositório da nossa memória. É nas nossas bibliotecas que estão os recursos para o desenvolvimento individual e coletivo. Tomando em consideração estas realidades, propõe-se:
- A criação de incentivos próprios ao crescimento de conteúdos culturais em ambiente digital em língua portuguesa e o alargamento de sistemas de tradução e distribuição de documentos em Português;
- A concretização da plena digitalização e interoperabilidade dos arquivos do Estado;
- O desenvolvimento de redes intermunicipais de bibliotecas, com o apoio técnico da Administração Central e dos processos de constituição de redes digitais de leitura;
- A articulação dos dispositivos arquivísticos e das bibliotecas com os países de língua portuguesa;
- O desenvolvimento de projetos de articulação entre bibliotecas públicas, bibliotecas escolares, bibliotecas privadas e a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, tendo em vista o aprofundamento do Plano Nacional de Leitura.